Interior paulista registra umidade do ar mais baixa da história


O estado de São Paulo vive dias de deserto. Em municípios do interior, como Descalvado e Bragança Paulista, a umidade relativa do ar chegou a níveis inéditos: 4% e 4,3%, respectivamente. Os números, divulgados pela Defesa Civil de São Paulo, aproximam a realidade paulista daquilo que se encontra nos desertos mais áridos do planeta, como o Saara e o Atacama.

Paulo Pinto/Agencia Brasil

A situação é alarmante quando se confronta com os parâmetros da Organização Mundial da Saúde (OMS). O órgão internacional recomenda 60% como nível mínimo de umidade para que o corpo humano funcione de maneira adequada. Abaixo de 30%, o ar já é considerado prejudicial; menos de 12% define estado de emergência. Em São Paulo, algumas cidades ultrapassaram negativamente até essa marca.

A secura extrema não é apenas desconforto — é um fator de risco. Médicos e especialistas em saúde pública alertam para a possibilidade de crises respiratórias, agravamento de doenças crônicas como a asma, além de desidratação e fadiga acentuada. Olhos e mucosas também sofrem, já que a falta de umidade prejudica as defesas naturais do organismo.

O cenário atual não se limita a impactos individuais: sistemas de saúde tendem a ficar sobrecarregados diante do aumento de atendimentos por problemas respiratórios e cardiovasculares associados ao calor e ao ar seco.

Se para o corpo humano a secura é um inimigo invisível, para o meio ambiente ela se traduz em risco de fogo. A vegetação seca torna-se combustível perfeito para incêndios, que avançam rapidamente e colocam brigadistas diante de desafios crescentes. O avanço das queimadas, somado às altas temperaturas, pode provocar perda de biodiversidade e degradação de ecossistemas já fragilizados.

Na cidade de Paulo de Faria, o termômetro passou dos 40 °C. Em Araçatuba e Tupi Paulista, os registros ficaram pouco abaixo dessa marca. O calor intenso, combinado à baixa umidade, cria condições ideais para o surgimento e a propagação de incêndios.

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Alerta sem precedentes

Nunca tantos municípios paulistas receberam um alerta tão severo. Ao todo, 511 cidades estão sob aviso oficial da Defesa Civil de São Paulo. Esse é o maior número já registrado desde o início do sistema de monitoramento para o período de estiagem.

As recomendações das autoridades são claras: hidratar-se constantemente, evitar atividades físicas sob sol forte, manter ambientes umidificados, utilizar soro fisiológico em olhos e narinas e, sobretudo, não usar fogo em limpeza de terrenos ou áreas agrícolas.

Apesar da gravidade da situação, a previsão meteorológica aponta algum alívio. Na região metropolitana de São Paulo, uma frente fria deve chegar nos próximos dias, trazendo chuviscos e temperaturas mais baixas. O fenômeno pode aliviar a situação imediata, mas não resolve a vulnerabilidade estrutural do estado diante de mudanças climáticas que intensificam extremos meteorológicos.

Mais do que um evento isolado, os índices registrados em 11 de setembro representam um alerta maior: a convivência com extremos climáticos tende a ser cada vez mais comum. A conjunção de ondas de calor, secas prolongadas e baixos níveis de umidade está desenhando um novo regime climático no Sudeste brasileiro.

A Caatinga e o Cerrado, historicamente biomas adaptados à aridez, parecem ter exportado sua realidade para o interior paulista. A diferença é que o avanço repentino da seca em São Paulo não encontra populações e infraestruturas preparadas para lidar com ela.

O desafio não é apenas sobreviver a esses episódios, mas planejar políticas públicas capazes de mitigar seus efeitos, investir em reflorestamento urbano, melhorar a gestão hídrica e adaptar sistemas de saúde e agricultura.

São Paulo, neste setembro, mostrou ao Brasil que o deserto pode nascer dentro de casa — e que lidar com ele será cada vez mais urgente.