Recursos de Belo Monte fortalecem Unidades de Conservação no Pará


A decisão da Justiça Federal da 1ª Região, após quase uma década de disputas, marcou um ponto de virada na gestão socioambiental da Amazônia. Foram finalmente destravados R$ 126 milhões em recursos de compensação da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, depositados pela Norte Energia em 2015 e bloqueados desde 2016. Com a atualização monetária, R$ 99 milhões serão destinados diretamente às Unidades de Conservação (UCs) federais, garantindo investimento em áreas cruciais do Xingu e de regiões vizinhas.

Agência Brasil

A proposta que definiu a aplicação dos recursos foi elaborada pelo Instituto Chico Mendes de Conservação e Biodiversidade (ICMBio) e aprovada no âmbito do Comitê de Compensação Ambiental Federal (CCAF). Em audiência de conciliação, participaram também o Ministério Público Federal (MPF), o governo do Pará, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e representantes da concessionária Norte Energia.

65c0b6a1-f135-4671-adae-d8f8d59ea371-400x252 Recursos de Belo Monte fortalecem Unidades de Conservação no Pará
Foto: Acervo Esec Terra do Meio

SAIBA MAIS: Rascunho de Plano Regional para Conservação dos Bagres Migratórios da Amazônia

Recursos para proteger a Amazônia

Do total, 79% do valor ficará com UCs federais e 21% com outras instâncias administrativas. Entre as áreas beneficiadas estão a Estação Ecológica da Terra do Meio, o Parque Nacional da Serra do Pardo e Reservas Extrativistas (Resex) do Xingu. Unidades emblemáticas como a Floresta Nacional do Jamanxim e o Parque Nacional da Amazônia também estão na lista de contempladas. Todas elas localizadas no Pará, em um território historicamente pressionado pela expansão agropecuária, mineração e conflitos fundiários.

Essa definição encerra um impasse iniciado quando o MPF questionou a destinação de parte do montante original ao Parque Nacional do Juruena, em Mato Grosso, distante da área de impacto direto da hidrelétrica. Ao comemorar a aprovação da proposta do ICMBio, o MPF destacou que a nova divisão está mais conectada às bacias do Xingu e vizinhas, além de responder a demandas de comunidades locais.

A importância da lei e das comunidades

Para Katia Torres, diretora da área de Ações Socioambientais e Consolidação Territorial em UCs no ICMBio, o avanço só foi possível graças à Lei nº 13.668/2018. A legislação abriu caminho para que compensações ambientais fossem destinadas a Reservas Extrativistas, mesmo quando estas não fossem diretamente atingidas por empreendimentos.

“Esses recursos eram muito aguardados e vão garantir a implementação das Unidades de Conservação no Arco do Desmatamento, além de apoiar a biodiversidade e fortalecer as economias da sociobiodiversidade”, afirmou Katia. A fala reforça a ideia de que a aplicação dos valores não se limita ao meio ambiente, mas também promove inclusão social, geração de renda e valorização das culturas tradicionais da Amazônia.

O Arco da Restauração

O desbloqueio dos recursos de Belo Monte também fortalece uma iniciativa estratégica: o Projeto Arco da Restauração, desenvolvido pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA), em parceria com o ICMBio e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). O programa prevê a recuperação de 6 milhões de hectares de áreas degradadas até 2030.

O chamado Arco do Desmatamento, que se estende por diversos estados da Amazônia, é historicamente a região mais pressionada pelo avanço do desmate e da pecuária extensiva. Transformá-lo em um cinturão verde de proteção e restauração é considerado um dos grandes desafios — e, ao mesmo tempo, uma oportunidade de alinhar conservação, desenvolvimento econômico e justiça social.

Justiça ambiental e legado

A decisão judicial representa mais que a liberação de recursos: é o reconhecimento de que empreendimentos de alto impacto, como Belo Monte, precisam gerar contrapartidas consistentes e eficazes. O acordo simboliza uma tentativa de corrigir desequilíbrios históricos, investindo em territórios diretamente relacionados às consequências da hidrelétrica.

Com a aplicação dos recursos, espera-se que as Unidades de Conservação beneficiadas ampliem sua capacidade de fiscalização, regularizem territórios, apoiem comunidades extrativistas e fortaleçam cadeias de valor ligadas à sociobiodiversidade. O impacto será sentido não apenas na conservação da floresta, mas na melhoria da qualidade de vida das populações que nela vivem.

Ao fim de quase uma década de bloqueios judiciais, a liberação dos R$ 99 milhões aparece como um marco que combina justiça, reparação e visão de futuro. Uma oportunidade de provar que o desenvolvimento da Amazônia pode ser feito com equilíbrio, valorizando a floresta em pé e as pessoas que dela dependem.