Amapá aposta na sociobioeconomia para transformar floresta em valor


Na terça‑feira, 21 de outubro de 2025, governo do Amapá, recebeu a equipe técnica envolvida na construção do Plano Estadual de Apoio à Sociobioeconomia (PEAS), juntamente com representantes da Secretaria de Estado do Meio Ambiente do Amapá (Sema), da Procuradoria‑Geral de Justiça do Estado do Amapá (PGE) e consultores do plano, para a etapa final de ajustes antes do lançamento oficial do instrumento de gestão, que está previsto para a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP30), a realizar‑se em novembro em Belém (PA).

Foto: Israel Cardoso/GEA

Durante o encontro, o governador sublinhou o papel central da sociobioeconomia como alternativa estratégica para o estado. Ele lembrou que, embora o tema do petróleo – a partir de pesquisas na costa amapaense – tenha recebido muita atenção, a aposta de sua gestão é diferente: transformar os ativos ambientais do Amapá em negócios “éticos, verdes e sustentáveis”. Ele enfatizou que o plano está sendo refinado para “transformar nossos ativos ambientais em negócios éticos e verdes e sustentáveis”.

O plano, instituído por meio de decreto em junho de 2024, moderniza a abordagem de desenvolvimento da Sema, valoriza saberes tradicionais, considera a biodiversidade amazônica e busca posicionar o Amapá como protagonista na bioeconomia global. Entre seus eixos estão o fortalecimento de cadeias produtivas sustentáveis, atração de investimentos verdes, geração de emprego e renda, pesquisa em biotecnologia, economia de baixo carbono, economia circular, consumo consciente e bem‑estar social — tudo isso operando em consonância com a preservação da floresta.

A secretária da Sema, Taísa Mendonça, destacou que esse é o primeiro plano estadual no Brasil a integrar de modo estratégico as dimensões social e bioeconômica. Segundo ela, o plano trabalha com indicadores sociais, aliados a um modelo de desenvolvimento que mantém a floresta viva. Ela classificou a iniciativa como revolucionária, pois traz soluções que nascem da floresta, com baixo carbono, preservação da biodiversidade e desenvolvimento socioeconômico responsável.

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Foto: Israel Cardoso/GEA

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O consultor técnico do plano, Sérgio Moreira, declarou tratar‑se de “um dia histórico”, afirmando que o Amapá agora inicia um futuro em que “o Estado tem petróleo e esse petróleo vai financiar esse futuro, que começa agora: florestas preservadas, rios limpos e pessoas felizes, com renda, dignidade e cidadania”. Essa fala reforça o caráter híbrido da proposta: não se trata apenas de explorar os recursos naturais ou de só investir na economia tradicional, mas de fundir conservação com inovação, conhecimento e valor agregado.

A trajetória do plano inclui múltiplas etapas. Inicialmente, foi elaborado o diagnóstico do território: levantamento de cadeias produtivas, mapeamento de comunidades tradicionais, extrativistas, agricultores familiares e empreendedores, além de oficinas participativas realizadas por diferentes regiões do estado. Em segundo lugar, a fase atual refere‑se aos ajustes finais do documento, com vistas à sua apresentação oficial em breve. A meta é que em cerca de duas semanas o refinamento esteja concluído. Conforme informado, o plano mapeou até 11 cadeias produtivas com potencial econômico a partir dos ativos ambientais do estado — um chamariz para investidores voltados aos negócios verdes.

Do ponto de vista interpretativo, este plano representa uma virada no paradigma de desenvolvimento para o Amapá. Em vez de seguir apenas o roteiro tradicional de exploração de recursos, ou esperar que o petróleo seja a grande “salvação” econômica, o governo aposta numa bioeconomia que reconhece a floresta não como obstáculo, mas como ativo. A floresta e a biodiversidade são colocadas no centro da equação de valor. Essa mudança de narrativa é relevante, porque o Amapá — historicamente com índices socioeconômicos baixos — aparece agora como uma nova fronteira de desenvolvimento, onde a preservação e o empreendedorismo se articulam.

A longa duração das políticas ambientais sem impacto amplo sugeria que era necessário criar instrumentos mais integrados e estratégicos; o PEAS surge como resposta. Ele propõe converter preservação em oportunidades produtivas — por exemplo, transformar a produção de açaí, madeira de manejo sustentável, pescado, biocosméticos, entre outros produtos da sociobiodiversidade, em economia organizada, regulamentada, de alto valor agregado e com respeito às comunidades que vivem da floresta.

Além disso, o plano traz o elemento da justiça socioambiental. As comunidades ribeirinhas, extrativistas, quilombolas e indígenas são chamadas não apenas como beneficiárias, mas como co‑criadoras do sistema de valor. Em oficinas e mapeamentos, essas vozes foram ouvidas para gerar soluções adaptadas às realidades locais, e não impor um modelo externo. Isso é fundamental para que o desenvolvimento não se traduza em expulsão ou descaracterização cultural, mas sim em protagonismo local.

No âmbito das políticas climáticas, o PEAS contribui para que o Amapá diga ao mundo: “Sim, estamos na Amazônia, mas temos projeto de futuro que combina floresta em pé com renda, turismo, cadeia produtiva, bioeconomia.” Apresentá‑lo na COP30 significa que o estado busca inserção internacional, atração de parcerias, investimentos e reconhecimento como laboratório de desenvolvimento tropical sustentável.

É preciso, porém, que a promessa vire execução. Dois desafios saltam aos olhos: a articulação entre diferentes órgãos governamentais (o plano envolve cerca de dez secretarias/órgãos estaduais) e a garantia de que os negócios verdes possuam efetiva viabilidade econômica, logística, regularização fundiária e acesso a mercado. Conforme mencionado em fontes, o processo vem contando com o apoio da GCF Task Force (Força‑Tarefa de Governadores para o Clima e Florestas), da USAID (Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional) e do CIAT (Centro Internacional de Agricultura Tropical). A sinergia entre governança local, parceiros internacionais e mercado será decisiva para que a promessa se realize.

Por fim, o plano traz consigo um convite: ao mercado, para ver oportunidades na floresta amazônica de forma sustentável; às comunidades, para assumir protagonismo; ao Estado, para coordenar instrumentos; e ao planeta, para evoluir rumo a um modelo de desenvolvimento que não sacrifique natureza por riqueza, mas que amplie riqueza por meio da natureza.