Impasse adia apresentação do Plano Clima brasileiro na COP30


O governo brasileiro adiou novamente o lançamento do Plano Clima, documento que define a estratégia nacional para reduzir emissões de gases de efeito estufa e ampliar a resiliência frente às mudanças climáticas. A nova previsão é que o anúncio ocorra no final da próxima semana, durante a reta final da COP30, que acontece em Belém, no Pará.

Foto: Wendell Andrade/Instituto Talanoa.

A decisão foi tomada após impasses sobre como contabilizar e distribuir responsabilidades pela redução das emissões associadas ao desmatamento em imóveis rurais privados — uma fatia crucial do total de gases lançados pelo Brasil na atmosfera. O entrave ocorre no momento em que o país tenta demonstrar ao mundo a viabilidade de suas metas climáticas e consolidar-se como liderança na agenda de descarbonização.

Divergência sobre emissões rurais trava consenso

O Plano Clima é um dos pilares da atualização da NDC brasileira — a Contribuição Nacionalmente Determinada, compromisso assumido pelo Brasil no âmbito do Acordo de Paris. A versão em discussão prevê que a redução das emissões geradas pelo desmatamento em áreas privadas alcance 232 milhões de toneladas de carbono até 2035, o que representaria quase metade (49%) do esforço nacional para atingir a meta mais ambiciosa.

O desafio é que esse recorte do desmatamento corresponde a 813 milhões de toneladas de carbono das 2,039 gigatoneladas de CO₂ equivalente (GtCO₂e) emitidas pelo país em 2022, segundo o Inventário Nacional de Emissões de GEE. A proposta original do plano setorial da agropecuária, colocada em consulta pública, previa reduzir 581 milhões de toneladas dentro do setor. No entanto, representantes do agronegócio se opuseram a assumir a responsabilidade direta pela mitigação do desmatamento, mesmo com a previsão de incentivos financeiros e tecnológicos.

Setor agropecuário resiste à vinculação com metas de desmatamento

Fontes do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) afirmam que a resistência partiu de entidades ligadas à produção agrícola, que alegam que a meta impõe ao setor uma carga desproporcional de responsabilidade. Já integrantes da equipe técnica do governo sustentam que sem a inclusão do desmatamento rural privado, o Brasil não atingirá sua NDC.

A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, tem defendido que o Plano Clima seja integrado e vinculante, articulando mitigação e adaptação em 16 planos setoriais — incluindo agropecuária, energia, transportes e indústria. Contudo, até a tarde de segunda-feira (10), não havia consenso político suficiente para submeter o documento à Convenção-Quadro da ONU sobre Mudança do Clima (UNFCCC).

Adaptação também em compasso de espera

Além da parte de mitigação, o Plano Nacional de Adaptação (PNA), que define 12 metas e estratégias para preparar o país frente a eventos extremos, também não foi formalmente entregue à ONU. Apesar de tecnicamente concluído, o documento depende da validação do plano principal.

O adiamento reforça as dificuldades internas de conciliar interesses ambientais, econômicos e setoriais, especialmente em um contexto em que o governo tenta conciliar o discurso de liderança climática com a necessidade de manter competitividade na produção agroexportadora.

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Contexto internacional e pressão sobre o Brasil

A indefinição ocorre em meio à crescente pressão internacional para que o Brasil apresente planos concretos de implementação, não apenas metas. O país tem sido apontado como peça-chave para o sucesso da COP30, tanto pelo seu papel como guardião da Amazônia quanto por seu potencial de liderar uma transição justa e sustentável.

Na conferência, líderes de diferentes países acompanham atentamente as negociações. O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) e o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) destacam o Brasil como um dos poucos países capazes de promover redução estrutural de emissões via controle do desmatamento.

Com o adiamento, o governo corre contra o tempo para apresentar uma versão revisada do Plano Clima ainda durante a conferência, evitando que o impasse interno comprometa sua imagem como anfitrião e articulador global da ação climática.

Um teste político e simbólico

Mais do que uma disputa técnica, o adiamento expõe o teste político da transição climática no Brasil. O plano, quando finalmente anunciado, será o principal instrumento para orientar políticas públicas, investimentos e compromissos internacionais até 2035. Sua ausência momentânea revela que o desafio da descarbonização não é apenas tecnológico, mas também de coordenação institucional e pacto federativo.

Em Belém, onde a COP30 ocorre com forte apelo à implementação e à resiliência, o episódio soa como um lembrete: o sucesso da transição verde brasileira depende menos de promessas e mais de consenso interno e execução concreta.