Uma estudante do Amapá acaba de conquistar um marco importante para a ciência na Amazônia. Com apenas 23 anos, Manuelle da Costa Pereira, do Instituto Federal do Amapá (Ifap), venceu a categoria Ensino Superior do 31º Prêmio Jovem Cientista com um projeto de kit solar, que pode transformar a vida dos extrativistas de castanha na floresta: um kit solar portátil adaptado às realidades amazônicas.

A solução surgiu do convívio direto de Manuelle com castanheiros na vila São Francisco do Iratapuru, no Vale do Jari. Vivendo a experiência dos extrativistas, ela percebeu que os geradores a diesel — caros, pesados e poluentes — representam um ônus enorme: exigem transporte difícil, custam caro e causam impacto ambiental. A partir desse diagnóstico, a estudante desenvolveu o “Kit Solar Castanheiro”, pensado para ser leve, acessível e eficiente.
O protótipo inicial já passou por várias evoluções. Da versão volumosa — equivalente a um contêiner de 1.000 litros — o kit foi refinado até caber em uma mochila de 50 litros. O custo de produção gira em torno de R$ 2,8 mil, beneficiando-se do reaproveitamento de bombonas descartadas — estratégia que alia sustentabilidade e reaproveitamento.
Apesar do tamanho reduzido, o equipamento não perde funcionalidade. A bateria alimenta lanternas, rádios, celulares e pequenos aparelhos, suprindo as necessidades básicas dos castanheiros durante longos períodos em campo: iluminação noturna, preparo de alimentos, recarga de equipamentos de comunicação — itens essenciais para quem vive entre as árvores e longe da rede elétrica.
O projeto foi iniciado em 2022, com apoio de uma bolsa de Iniciação Tecnológica pelo CNPq, que possibilitou à estudante desenvolver a ideia sem sair de sua terra natal, Laranjal do Jari (AP). Com orientação do professor Diego Armando Silva da Silva (Ifap) e inserida no Centro de Estudos em Ecologia e Manejo na Amazônia, Manuelle acompanhou de perto os desafios e rotina dos extrativistas — um contato intenso e essencial para o desenho de uma solução realista.

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Em 2023, o kit foi registrado como Modelo de Utilidade no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), com apoio do Núcleo de Inovação Tecnológica do Ifap e da FAPEAP (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amapá). Esse passo formal assegura a propriedade intelectual da invenção e abre caminho para eventuais ampliações, parcerias ou produção em maior escala.
O reconhecimento concedido pelo Prêmio Jovem Cientista é muito mais que um troféu: simboliza o valor da ciência feita na Amazônia, por quem vive nela. A conquista histórica — é a primeira vez que uma estudante do Amapá ganha essa categoria do prêmio — coloca em evidência o potencial de soluções locais para problemas complexos como energia, meio ambiente e desenvolvimento sustentável.
Mas o caminho ainda é longo. Manuelle mesma admite que o próximo passo será buscar financiamento e apoio institucional para transformar o protótipo em produto acessível para comunidades extrativistas de todo o território amazônico. A meta é que o kit se torne um instrumento real de redução da pegada de carbono, substituindo geradores a diesel e facilitando a vida no campo.
O “Kit Solar Castanheiro” carrega uma promessa maior. Ele representa um gesto concreto de reconciliação entre tecnologia, meio ambiente e modos de vida tradicionais. É, também, um sinal de que a Amazônia pode gerar inovação, desenvolvimento e inclusão sem abrir mão da floresta — e que, nesse processo, as vozes locais merecem protagonismo.














































