Uma pesquisa publicada na revista Nature Geoscience revelou uma peça crucial no entendimento da formação de chuvas na Amazônia, uma região chave para o clima global. O estudo mostra que a floresta amazônica pode produzir aerossóis (partículas) que, induzidos pela própria chuva, iniciam novos ciclos de formação de nuvens e precipitação, influenciando o ciclo da água, o clima e o balanço energético do planeta.
De acordo com o estudo, a chuva aumenta a concentração de ozônio, que oxida moléculas liberadas por gases da floresta, especialmente terpenos. Esta oxidação gera pequenas partículas logo acima das copas das árvores, formando núcleos de condensação que promovem a formação de nuvens mesmo em ar limpo durante a estação chuvosa.
A descoberta lança novas luzes sobre as complexas interações químico-atmosféricas e meteorológicas na Amazônia, um fenômeno descrito como “oceano verde” devido à sua capacidade de criar seu próprio ciclo de nuvens e chuvas. Até agora, acreditava-se que esses aerossóis vinham de altitudes maiores.
Para que haja chuva, além do vapor d’água, são necessárias partículas atmosféricas que atuem como núcleos de condensação, onde o vapor se transforma em gotículas. No entanto, a origem dessas partículas na Amazônia não era completamente compreendida, especialmente na estação chuvosa.
Uma equipe internacional de pesquisadores do Brasil, Alemanha e Suécia analisou dados extensivos do Observatório de Torre Alta da Amazônia (ATTO) para explicar esse processo. Incluíram dados meteorológicos e de gases, mostrando que a chuva limpa a atmosfera, mas também inicia a formação de novas partículas que se tornam núcleos de condensação para a próxima chuva.
“A chuva limpa a atmosfera, reduzindo o número de partículas, mas ao mesmo tempo inicia um processo de formação de novas partículas que servirão como núcleos de condensação para a próxima precipitação,” explica Luiz Augusto Toledo Machado, pesquisador do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (IF-USP).
A pesquisa, apoiada pela FAPESP, revelou que após a chuva, a concentração de partículas é maior próximo ao topo das árvores, indicando que são formadas dentro da floresta, especialmente durante a estação chuvosa.
Impactos Climáticos
Essas descobertas são essenciais para entender como mudanças nos padrões climáticos da Amazônia podem afetar o clima global e a estabilidade ecológica. Segundo Ulrich Pöschl, do Instituto Max Planck, essa nova compreensão das interações entre aerossóis, nuvens e precipitação na Amazônia é crucial para prever alterações no balanço radiativo da Terra.
O Brasil enfrenta uma das piores secas da história, afetando 69% dos municípios da Amazônia Legal nos primeiros seis meses do ano. A crise climática, exacerbada pelo El Niño, reduziu drasticamente os níveis dos rios, impactando populações ribeirinhas e o abastecimento.
Apesar da queda de 30,6% no desmatamento entre agosto de 2023 e julho de 2024, a degradação da floresta, principalmente por queimadas, aumentou. Segundo Machado, a presença da floresta é crucial para a formação de partículas que promovem chuvas.
O ATTO, localizado na Reserva Biológica de Uatumã, a 150 km de Manaus, é administrado por cientistas do Brasil e da Alemanha e possui uma torre de 325 metros de altura.
Avanços na Pesquisa
Em 2016, o grupo descobriu a formação de novas partículas no topo da troposfera, a 14 km de altura. Um novo estudo está em andamento para explicar esse processo detalhadamente.
Os cientistas conduziram o experimento CAFE-Brazil (Chemistry of the Atmosphere: Field Experiment in Brazil) em 2023 para medir e descrever a formação de partículas na atmosfera superior. Futuras pesquisas precisarão de experimentos em câmaras ao nível das copas das árvores para entender melhor a influência do ozônio na formação dessas partículas.
O artigo completo pode ser acessado em: Nature Geoscience.