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É preciso não só avançar no entendimento sobre a evolução humana, mas também reduzir a nossa ignorância sobre o tema

Para entender como se deu a evolução humana é preciso pegar na lâmpada bruxuleante da história e tropeçar na trilha do passado, tentando reconstruir cenas, reviver suas ressonâncias e, assim, acender a paixão de tempos anteriores, disse o paleoantropólogo Bernard Wood na conferência “Evolução humana: conquista e desafios”, proferida ontem (10/10) no Auditório da FAPESP. O evento integra a série Conferências FAPESP 2023.

Pegando emprestado uma frase de Winston Churchill sobre história, Wood se dispôs a explicar em que consistem as descobertas e os desafios que permitem compreender como se deu a evolução humana ao longo de milhões de anos.

“Como fazemos isso? A resposta está em obter mais evidências e dados a partir de novos registros fósseis, ou extrair mais informações dos fósseis já disponíveis. Você pode encontrar mais fósseis em sítios conhecidos ou procurar novos locais. Também é preciso melhorar as maneiras de analisar os dados coletados. Assim, além de varreduras a laser mais precisas sobre a morfologia externa de fósseis, também é possível coletar informações por meio de técnicas médicas não invasivas, como tomografia computadorizada ou observação de isótopos estáveis e sequenciamento de DNA”, disse o cientista.

Dessa forma, o estudo da evolução humana conta também com provas inusitadas, como o desenho e a composição do dente de um hominídeo que viveu sobre a Terra há mais de 2 milhões de anos – que pode, por exemplo, sugerir o que ele comia – ou a análise do solo e de insetos, que entrega informações importantes sobre o clima e as condições de vida na época.

Entre outros exemplos de “lâmpadas bruxuleantes” que possibilitam uma maior compreensão da evolução humana citados por Wood estão estudos com o uso de micro CT (microtomografia), análise de carbonatos do paleossolo, assinaturas de isótopos estáveis, morfologia dentária e 3D geometric morphometrics (ferramenta que descreve a forma tridimensional de superfícies ortodônticas).

“Meu trabalho não tem sido apenas o de avançar o nosso entendimento sobre a evolução humana, mas o de reduzir a nossa ignorância sobre o tema. E como se faz isso? Por meio de provas e dados a partir de registros fósseis em sítios existentes ou novos sítios, pelos avanços na forma como analisamos os dados que coletamos e também como conseguimos extrair informações adicionais desses registros fósseis”, contou.

Wood é diretor do Centro de Estudos Avançados de Paleobiologia da Universidade George Washington (Estados Unidos) e um dos mais renomados paleoantropólogos em atividade do mundo. Autor de 20 livros e de mais de 250 artigos científicos, o britânico é conhecido por suas pesquisas sobre as origens do gênero Homo, a paleobiologia do Paranthropus boisei (um dos primeiros hominíneos que viveram na Europa, há cerca de 1 a 2 milhões de anos), a sistemática dos hominídeos, a reconstrução da filogenia, a morfologia comparativa e a epistemologia na paleoantropologia.

Árvore da vida

Em 1966, quando então estudante de medicina que gostava de anatomia, Bernard Wood teve o primeiro contato com a paleoantropologia a partir de um curso de primatologia e evolução humana. Havia apenas nove hominini – primatas da família Hominidae, que inclui chimpanzés, bonobos, humanos e seus antepassados extintos. Entre homininis arcaicos, transacionais e modernos figuravam os Homo sapiens, H. neanderthalensis, H. heidelbergensis, H. rhodesiensis, H. erectus, H. habilis, Australopithecus africanus, Paranthropus robustus e Paranthropus boisei.

Quase 60 anos depois, em 2023, as linhagens de hominini registradas já chegavam a 31 táxons entre homininis arcaicos, modernos, pré-modernos e possivelmente primeiros homininis. Além de uma série de novos fósseis do gênero Homo pré-moderno, figuram mais taxa de homininis arcaicos como o Au. afarensis (que viveu há quase 4 milhões de anos) assim como possíveis primeiros homininis, como é o caso do Orrorin tugenensis, Ardipithecus ramidus, Ar. Kadabba e Sahelanthropus tchadensis (que pisou na terra há prováveis 7,5 milhões de anos). Vale ressaltar que, dependendo da análise, esse número pode ser reduzido.

A carreira de Wood na paleoantropologia começou em 1977, quando ele foi convidado por Richard Leakey para se tornar membro do que mais tarde ficou conhecido como Projeto de Pesquisa Koobi Fora. Ele foi um dos três anatomistas (Michael Day e Alan Walker foram os outros) encarregados de descrever os fósseis de hominídeos recuperados em East Rudolf (Quênia). O trabalho rendeu uma importante monografia, em 1991, sobre os restos cranianos de hominínios da Formação Koobi Fora, um atlas de anatomia dos tecidos moles dos monos.

Em outro estudo, Wood descobriu que, há cerca de 8 milhões de anos, havia um ancestral comum entre os humanos modernos, os chimpanzés e os bonobos. Isso significa que chimpanzés e bonobos estão mais próximos de humanos do que gorilas, por exemplo.

“Não se sabe exatamente por que isso acontece. Mas, em algum momento, entre 15 e 12 milhões de anos atrás, passamos para o pequeno ramo que deu origem aos humanos modernos contemporâneos e aos macacos africanos vivos. Entre 11 e 9 milhões de anos atrás, o ramo dos gorilas se separou, deixando apenas um único ramo composto pelos ancestrais dos chimpanzés, dos bonobos e dos humanos modernos. Entre 8 e 6 milhões de anos atrás, esse ramo muito delgado dividiu-se em dois ramos. Um dos galhos termina na superfície da árvore da vida com chimpanzés e bonobos; o outro leva aos humanos modernos”, explicou.

Divisores x aglutinadores

Mas, como afirmou Wood, ao mesmo tempo que “não é porque não tem um registro fóssil que não tenha existido uma espécie”, é provável que haja um excesso de divisão.

Ele explicou na palestra, e também em seu livro Human Evolution, a Very Short Introduction (Oxford University Press, 2019, 2ª ed.), que a interpretação da taxonomia na evolução humana reconhece um número relativamente grande de espécies. “Existem aqueles que reconhecem um maior número de espécies e os que têm uma maior propensão a aglutinar. Ambos estão olhando para as mesmas evidências, apenas as interpretam de forma diferente”, afirmou.

Wood contou que a grande causa das divergências entre os paleoantropólogos sobre quantas espécies podem ser identificadas no registro fóssil de hominídeos se deve a diferenças na forma de interpretar uma variação. Dessa forma, os pesquisadores que ressaltam as importâncias das continuidades (evolução) no registro fóssil geralmente optam por menos espécies, enquanto aqueles que estão mais dispostos a reconhecer e enfatizar as descontinuidades tendem a reconhecer mais espécies.

“Não podemos esquecer que a evidência genética é uma ferramenta muito poderosa para o estudo da evolução, mas ela só volta até uma pequena porção da evolução humana. É por isso que a maioria das evidências continua sendo baseada em registros fósseis”, comentou.

Em sua primeira visita ao Brasil, Bernard Wood proferiu duas palestras, uma no Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (IEA-USP) e outra na FAPESP. A viagem do pesquisador vai contar ainda com reuniões de orientação a alunos brasileiros do grupo do professor Walter Neves (IEA-USP) e uma viagem de campo a Lagoa Santa (MG), sítio arqueológico onde foi encontrada Luzia, o fóssil de Homo sapiens mais antigo da América do Sul, com cerca de 12.500 a 13.000 anos.

A íntegra da Conferência está disponível em: www.youtube.com/watch?v=2r7DCa88_Xo.

Método com coparticipação de moradores é eficaz em políticas de combate a riscos de desastres ambientais

Um mapa digital de áreas vulneráveis a inundações nas cidades de São Paulo e Rio Branco (AC) montado por alunos de escolas públicas; um histórico de enchentes registradas em um bairro pobre da capital paulista criado com base em relato dos próprios moradores; novos canais de comunicação implantados com a Defesa Civil para melhorar o sistema de alertas para a comunidade. Esses são alguns dos instrumentos de participação e mobilização de cidadãos que se mostraram eficazes em iniciativas para aumentar a resiliência a riscos de catástrofes urbanas.

Compõem agora uma metodologia publicada em artigo na revista científica Global Environmental Change. Resultado de pesquisa desenvolvida por mais de três anos, envolvendo 17 cientistas brasileiros e de outros países, o trabalho conclui que as soluções transformadoras de dados urbanos devem abranger não só o desenvolvimento e a implantação de novas tecnologias digitais, mas também a coprodução de entendimentos, perspectivas, práticas sociais e arranjos de governança. Isso inclui uma combinação de ferramentas de análise de dados com uma ampla gama de métodos participativos, possibilitando transformações justas e sustentáveis.

As mudanças climáticas associadas ao crescimento de populações vulneráveis em todo o mundo elevaram os impactos socioeconômicos e ambientais relacionados a catástrofes. Estima-se que 1,81 bilhão de pessoas (23% da população global) estejam diretamente expostas a riscos significativos de inundações, das quais 89% moram em países de baixa e média renda.

No Brasil, quatro em cada dez municípios são considerados vulneráveis a desastres relacionados a inundações ou deslizamentos, de acordo com dados do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), que monitora atualmente 1.038 municípios com acompanhamento diário e emissão de alertas quando há risco de chuva fora dos níveis médios, considerados “normais”.

“Esse artigo sintetiza a trajetória de um projeto, sua conclusão e, em especial, sua continuidade como política pública de educação ambiental em redução de riscos de desastres com o Programa Cemaden Educação. A principal contribuição científica é a metodologia construída, com um novo jeito de produzir os dados, incorporando tecnologias de informação e um processo de coprodução com as comunidades e moradores. Também buscamos um olhar multidisciplinar, com um grupo envolvendo profissionais ligados a administração pública, estudos urbanos, geografia, ciência da computação e educação ambiental, além de humanidades e desenvolvedores de software”, sintetiza João Porto de Albuquerque, pesquisador da Universidade de Glasgow (Escócia) e autor correspondente do artigo.

Os resultados são parte do projeto “Dados à Prova d’Água” (WPD, na sigla em inglês), desenvolvido por meio de parceria entre as universidades de Glasgow e Warwick (Reino Unido), Heidelberg (Alemanha), além de Cemaden e Fundação Getúlio Vargas (FGV). O grupo tem apoio da FAPESP, do Fundo de Pesquisa e Inovação do Reino Unido e do Ministério para Educação e Pesquisa da Alemanha, em coordenação com Research Funding Agency Cooperation in Europe (Norface), Belmont Forum e Conselho Internacional de Ciência.

O artigo recebeu financiamento da FAPESP por meio de mais três projetos (19/06616-0, 19/06595-2 e 18/06093-4).

Com a crise climática, eventos extremos já têm ocorrido com mais frequência e intensidade, segundo o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), das Nações Unidas. Levantamento de janeiro deste ano feito pelo Serviço Geológico do Brasil (vinculado ao Ministério de Minas e Energia) mostrava que cerca de 3,93 milhões de brasileiros moravam em 13.500 áreas de risco espalhadas pelo país.

Relatório divulgado em 2018 por Cemaden e Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) já apontava 8,2 milhões de moradores em regiões sujeitas a deslizamentos de terra e inundações em 872 municípios.

São essas regiões as mais afetadas por chuvas, inundações e deslizamentos, como os que atingiram o Estado do Rio Grande do Sul no início de setembro, com dezenas de mortos e destruição em vários municípios, além do desastre registrado em cidades do litoral norte de São Paulo no início do ano, quando mais de 60 pessoas morreram e diversos prejuízos econômicos foram registrados.

Geração de dados

“Nosso trabalho tem uma aplicação muito clara em temas ligados à emergência climática e à tomada de decisão baseada em evidências. Temos um problema concreto no Brasil e em vários outros países que é a falta de dados, uma desigualdade que precisa ser considerada na construção de políticas públicas. O projeto mostrou que há formas de mudar a maneira como o governo lida com a questão de dados, incluindo as pessoas e os territórios”, afirma à Agência FAPESP a professora da FGV Maria Alexandra Cunha, coautora do artigo.

A pesquisa já resultou em um aplicativo gratuito (disponível para Android) que permite a coleta de dados em locais estratégicos por meio de ciência cidadã para obter informações como o volume de chuva, a ocorrência de alagamentos e o nível da água de rios. Esses dados são transmitidos em tempo real para uma plataforma digital (com mapas interativos), que pode ser acessada por comunidades locais.

A plataforma foi integrada ao website do programa Cemaden Educação, que trabalha com escolas e comunidades, e vem sendo usada como parte de uma campanha nacional de prevenção de desastres.

Visando amplificar os aprendizados do projeto para outras regiões, foi criado um Guia de Aprendizagem, que pode ser adotado para engajar estudantes e voluntários na produção de dados e de conhecimento sobre desastres provocados pelo excesso de água ou falta de drenagem urbana (leia mais em: agencia.fapesp.br/39503).

“O Programa Cemaden Educação criou metodologias participativas e transformadoras e conseguiu consolidar uma rede de escolas, jovens, moradores e comunidades locais. Projetos como o ‘Dados à Prova d’Água’ entram nesse processo. Isso nos ajuda a sair de estudo de caso e ganhar escala. Nossa expectativa é que a metodologia seja cada vez mais aplicada”, diz o pesquisador do Cemaden Victor Marchezini, coautor do estudo.

Passos

Ao longo do trabalho, os pesquisadores usaram inovações em dados dialógicos, pautados pela linha do educador Paulo Freire e baseados na criação de redes de construção de conhecimento.

Com isso, desenvolveram iniciativas ligadas a 1) análise situacional (baseada em experiências vividas pela comunidade e temas geradores de debate); 2) dados geradores (levantando novos entendimentos por meio de dados); 3) compreensão crítica da realidade (mudando perspectivas de ação); 4) situações-limite (identificando condições de vida insustentáveis) e 5) inéditos viáveis (coproduzindo resultados que abrem caminhos para soluções).

Produziram intervenções metodológicas que contribuíram para tornar as experiências de moradores visíveis por meio de dados, fazendo com que as comunidades se envolvessem e compartilhassem essas histórias e experiências. Em um dos casos, um morador de Jaboatão dos Guararapes (PE) chegou a escrever um poema, em formato de cordel, descrevendo as práticas de dados das quais participaram.

Os resultados, além de gerar informações e dados produzidos pela comunidade, permitiram maior circulação e uso deles, abrindo novos caminhos de soluções e transformações. “Um primeiro passo para buscar solução para os problemas é torná-los visíveis, produzindo dados, evidências e conhecimento em cada comunidade. Nossa ideia é que o projeto continue levando a abordagem inclusive para outros países, como a Colômbia, onde já temos trabalhado”, completa Albuquerque.

O artigo Dialogic data innovations for sustainability transformations and flood resilience: The case for waterproofing data pode ser lido em: www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0959378023000961#s0035.

Plantas do Cerrado combinam pelo menos duas estratégias para resistir ao fogo, revela estudo

Em estudo publicado na revista Flora, pesquisadores da Universidade Estadual Paulista (Unesp) detalharam algumas das diferentes estratégias que as plantas do Cerrado desenvolveram ao longo da evolução para se proteger do fogo e rebrotar rapidamente após episódios de incêndio.

O artigo tem como primeiro autor o doutorando Marco Antonio Chiminazzo e foi reconhecido como Highlighted Student Research (Destacada Pesquisa de Estudante) pela revista. Aluno de pós-graduação da Unesp em Rio Claro, Chiminazzo recebeu apoio da FAPESP durante seu mestrado e doutorado.

Participaram da pesquisa sua orientadora, Alessandra Fidelis, professora do Departamento de Biodiversidade da Unesp-Rio Claro; sua coorientadora Aline Bombo, pós-doutora pela mesma instituição; e seu coorientador Tristan Charles-Dominique, pesquisador na Sorbonne Université e na Université de Montpellier, na França.

“Eventos de fogo fazem parte da história da vegetação savânica do Cerrado. E, para sobreviver às queimadas, as espécies vegetais desenvolveram diversas estratégias, que foram aprimoradas por diferentes linhagens ao longo da evolução. Desde os primeiros estudos feitos no bioma, é sabido que as plantas do Cerrado possuem cascas espessas, capazes de proteger seus tecidos internos. E também uma grande diversidade de órgãos subterrâneos, capazes de assegurar a rebrota a partir de estruturas protegidas abaixo do solo. Contudo, as duas estratégias exigem grande mobilização de recursos por parte das plantas. Nossa pergunta principal foi se elas poderiam realizar ambas ao mesmo tempo – isto é, se espécies típicas do Cerrado que possuem órgãos subterrâneos também seriam capazes de produzir quantidades significativas de casca acima do solo”, conta Chiminazzo.

Além disso, dado o potencial de espécies se propagarem de forma clonal, dependendo do tipo de órgão subterrâneo que possuam, o pesquisador buscou investigar se existe alguma diferença na produção de casca e proteção de gemas entre espécies com e sem capacidade de crescimento clonal. E, visto que plantas clonais geralmente são menores, pois dividem seus recursos entre crescimento em altura e crescimento lateral, buscou-se saber também se há relação entre a altura máxima que as plantas podem crescer e a capacidade de se propagar ou não de forma clonal.

“O que fizemos, em um primeiro momento, foi repassar a literatura, a fim de identificar espécies lenhosas do Cerrado cujos órgãos subterrâneos e taxas de produção de casca acima do solo haviam sido descritos. Em seguida, realizamos excursões de escavação e coleta em áreas de campo sujo e de cerrado stricto sensu a fim de analisar os órgãos”, conta Chiminazzo.

As excursões foram realizadas na Estação Ecológica de Santa Bárbara, no município de Águas de Santa Bárbara, interior de São Paulo.

“Posteriormente, as espécies foram agrupadas em relação aos seus tipos de órgãos subterrâneos e à capacidade de se desenvolverem ou não de forma clonal. Avaliamos três tipos de órgãos subterrâneos mais comuns encontrados em savanas: rizoma lenhoso, também conhecido como sóbole, responsável pelo crescimento clonal; e xilopódio e root crown, que não proporcionam crescimento clonal”, prossegue o pesquisador.

Por meio da comparação entre órgãos subterrâneos e taxa de produção de casca, o estudo mostrou que as espécies do Cerrado são capazes de produzir altas quantidades de casca, de até 0,9 milímetro por unidade de crescimento, e, ao mesmo tempo, apresentar órgãos abaixo do solo especializados para a rebrota. Ou seja, as espécies do Cerrado podem tanto se proteger do fogo acima do solo quanto esconder grande parte de sua biomassa abaixo do solo, que atua como isolante térmico durante as queimadas.

“Também encontramos uma divisão clara entre espécies que crescem de forma clonal e aquelas que ocupam um único espaço durante todo o seu ciclo de vida. Especificamente, vimos que espécies clonais que apresentam rizomas lenhosos geralmente possuem maior produção de casca, melhor proteção e um maior potencial de crescer em altura quando comparadas a espécies que possuem xilopódios e root crowns”, informa Chiminazzo.

Segundo o pesquisador, essas diferenças sugerem duas estratégias distintas de plantas capazes de rebrotar de gemas subterrâneas: o crescimento clonal, atrelado a um empenho considerável na proteção de ramos aéreos; e a persistência em um mesmo local, possivelmente ligada a um maior empenho em gemas presentes em órgãos subterrâneos.

“Este trabalho revela que espécies do Cerrado são capazes de ‘apostar’ em diferentes estratégias para se proteger do fogo. Geralmente, espera-se que a espécie ‘invista’ em estratégias acima ou abaixo do solo. Ou seja, uma coisa ou outra. O potencial de ‘investir’ em ambas as estratégias indica uma grande adaptação ao fogo por parte de plantas lenhosas do Cerrado. Por apresentarem estratégias de regeneração e persistência tanto aéreas quanto subterrâneas em relação ao fogo, essas espécies podem sobreviver a eventos de queimada de diferentes intensidades”, comenta Bombo.

Como explica a pesquisadora, os próximos passos envolvem compreender em quais regimes de fogo as estratégias de regeneração e persistência aéreas, subterrâneas ou a combinação de ambas são favorecidas.

“Isso talvez contribua para uma melhor compreensão dos diferentes estoques de carbono acima e abaixo do solo no Cerrado. Além disso, uma comparação com diferentes savanas ao longo do globo permitirá avaliar se os resultados deste estudo também se estendem a outros tipos de vegetação que são expostos a eventos de fogo”, afirma Bombo.

O estudo também recebeu financiamento por meio de outros dois projetos (17/02934-1 e 15/06743-0).

Bioma em risco

O Cerrado é hoje o bioma mais ameaçado do Brasil. Enquanto o desmatamento da Amazônia diminuiu de forma significativa em 2023, o desmatamento do Cerrado atingiu percentuais recordes. Nos cinco primeiros meses do ano, cresceu 35% em comparação com o mesmo período do ano anterior. Esse acréscimo corresponde a 3.532 quilômetros quadrados de destruição. E os números, divulgados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), são extremamente preocupantes, pois, além de ser a savana mais biodiversa do mundo, detentora de 33% de toda a biodiversidade brasileira, o Cerrado abriga as nascentes das três maiores bacias hidrográficas da América do Sul.

Enquanto a destruição avança, importantes pesquisas científicas têm sido conduzidas com o objetivo de prevenir incêndios (leia mais em: agencia.fapesp.br/41868 ) ou de utilizar adequadamente o fogo como estratégia de manejo (leia mais em: agencia.fapesp.br/25865). Outros estudos mostram também a incrível resiliência e poder de regeneração das espécies vegetais do Cerrado, que evoluíram durante milhões de anos na presença de eventos de fogo (leia mais em: agencia.fapesp.br/40988).

O artigo To protect or to hide: why not both? An investigation of fire-related strategies in Cerrado woody species pode ser acessado em: www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0367253023001408.

Ibama autoriza Petrobras a buscar petróleo em bloco secundário da Margem Equatorial

A Petrobras conquistou a aprovação ambiental para iniciar operações de exploração de petróleo em dois blocos na chamada Margem Equatorial do Brasil. Esses blocos estão situados na Bacia Potiguar, ao largo da costa do Rio Grande do Norte, onde a empresa já mantém operações, segundo reportagem do Estado de S. Paulo. A licença para a exploração, que envolve a perfuração em um desses blocos em busca de petróleo, foi emitida pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e representa um marco importante para a atual administração da Petrobras, que tem planos ambiciosos de expandir sua presença na Margem Equatorial para reforçar suas reservas. Vale lembrar que, em maio, o Ibama negou uma licença similar para a exploração no litoral do Amapá, decisão que a estatal recorreu.

“Uma vez que as possibilidades sejam confirmadas através de pesquisas, teremos a garantia de mais recursos para áreas essenciais como saúde, educação e desenvolvimento regional por meio do Fundo Social”, afirmou o Ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, quando procurado para comentar a notícia. A licença permitirá que a Petrobras avalie as oportunidades de exploração em dois blocos exploratórios específicos: BM-POT-17 e POT-762. Essas concessões foram adquiridas pela Petrobras em rodadas de licitação realizadas pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) em 2006 e 2018, respectivamente.

Maior estudo sobre epilepsia do mundo revela ‘arquitetura genética’ da doença e indica novas terapias

Considerado o maior estudo genético sobre epilepsias do mundo, um trabalho publicado na revista Nature Genetics revela alterações específicas no DNA que sinalizam maior risco para o distúrbio cerebral. A identificação dessas alterações permitirá melhorar o diagnóstico e avançar na possibilidade de novos tratamentos para a doença.

Os pesquisadores identificaram 26 áreas (loci) distintas do genoma que estão ligadas à epilepsia, com 29 genes que provavelmente desempenham um importante papel no distúrbio. Desse total de genes, 17 foram associados à epilepsia pela primeira vez; dez estão ligados ao desenvolvimento da doença quando eles sofrem mutação ou alteração (chamados genes de epilepsia monogênica) e os outros sete são conhecidos por já terem medicamentos aprovados que atuam com foco no tratamento de transtornos do espectro do autismo.

A análise dos subtipos revelou “arquiteturas genéticas” significativamente diferentes entre, principalmente, dois subtipos de epilepsias – as focais e as generalizadas, sendo que variações comuns no DNA podem explicar entre 39,6% e 90% do risco genético para este último tipo.

Coordenada por um consórcio da Liga Internacional Contra a Epilepsia (ILAE,  na sigla em inglês), que envolveu mais de 350 cientistas, a pesquisa comparou dados de 29.944 pessoas com a doença aos de outros 52.538 indivíduos-controle. Incluiu casos de epilepsia de ascendência europeia (92%), africana (3%) e asiática (5%).

O Brasil foi o único representante da América Latina por meio do Instituto Brasileiro de Neurociência e Neurotecnologia (BRAINN), um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID) da FAPESP sediado na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

“Nós do BRAINN estivemos envolvidos em todas as etapas do trabalho, desde a caracterização detalhada dos pacientes do ponto de vista clínico, de imagem, da neurofisiologia – que temos ótimas condições de fazer – até o planejamento das análises, sugestões de como poderiam ser realizadas e depois a verificação dos resultados. Nossa participação foi ativa também na escrita do artigo, submetido à revista há mais de um ano. Muitos estudos internacionais excluem pacientes do Brasil porque temos uma diversidade genômica muito grande. Mas, neste trabalho, foi feita uma metanálise que permite combinar populações com diferentes estruturas genômicas. Para o futuro, queremos ampliar ainda mais essa diversidade”, conta à Agência FAPESP Iscia Teresinha Lopes-Cendes, professora da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp e coautora do artigo pelo BRAINN.

Estima-se que haja cerca de 2 milhões de brasileiros com epilepsia, sendo que pelo menos 25% não estão com a doença controlada, segundo o Ministério da Saúde. No mundo, a Organização Mundial da Saúde (OMS) calcula que 50 milhões de pessoas são afetadas pelo distúrbio, sendo um terço resistente aos tratamentos disponíveis no mercado.

Doença neurológica altamente hereditária e sem cura, a epilepsia provoca crises convulsivas, chegando, nos casos mais graves, a 40 ou 50 convulsões por dia, com perda de sentido e queda. As crises não controladas, além de ter impacto na rotina do paciente, são um grave risco de morte súbita e prematura.

O tratamento é feito com uma combinação de medicamentos, que nem sempre é eficaz. A maior parte das medicações diminui a atividade dos neurônios de forma generalizada, controlando as crises, mas provoca efeitos colaterais. Uma alternativa é a cirurgia, em que é retirada a parte do cérebro afetada pela malformação.

Agora, os pesquisadores estão propondo algumas medicações que normalmente são usadas para outras situações, mas agem sobre os genes de risco para epilepsia apontados no estudo.

Conhecimento ao longo do tempo

Reconhecendo a complexidade de fatores genéticos e ambientais relacionados à epilepsia, o consórcio foi formado em 2010 para investigar grandes conjuntos de dados em colaboração com escala internacional.

“Este é um marco importante para o Consórcio ILAE sobre Epilepsias Complexas, demonstrando o que pode ser alcançado quando os cientistas colaboram abertamente e partilham dados de todo o mundo”, disse a presidente da liga, a professora Helen Cross, em comunicado à imprensa.

Para chegar aos resultados que sugerem arquiteturas genéticas diferentes entre as formas focais e generalizadas de epilepsia, foram combinados dados genéticos a bancos com informações fenotípicas, aumentando a amostra para mais de 51.600 pacientes e 1 milhão de “controles”. Essa descoberta do quadro genético diferente para os diversos tipos de epilepsias fornece pistas para entender as várias síndromes.

No trabalho, os cientistas apontam que as proteínas que transportam impulsos elétricos por meio das lacunas entre os neurônios do cérebro constituem parte do risco de formas generalizadas de epilepsia. Nesse sentido, enfatizam a importância de caracterizar ou classificar com precisão as síndromes epilépticas específicas (fenotipagem sindrômica) para melhor compreender a base genética da doença.

Defensora de estudos com os chamados “dados puros”, Lopes-Cendes diz que está trabalhando agora especificamente com epilepsia do lobo temporal mesial (ELTM) com atrofia hipocampal. “Temos gerado dados continuamente para uma pesquisa específica sobre o tema. Defendo que, em determinados estudos, misturar informações de tipos diferentes de epilepsia pode ‘diluir’ o dado, não destacando resultados que poderiam aparecer se o grupo de pacientes estudado fosse mais homogêneo. Acho que é preciso um equilíbrio”, completa.

No início do ano, a pesquisadora e seu grupo publicaram outro artigo aprofundando o entendimento sobre ELTM, considerada a mais comum e refratária ao tratamento farmacológico, ao avaliar, pela primeira vez, o perfil do RNA mensageiro (mRNA, molécula que contém a informação para a produção de proteínas) de tecido cirúrgico obtido de pacientes (leia mais em: agencia.fapesp.br/40847).

Por seu trabalho com genética, Lopes-Cendes foi convidada recentemente pela OMS para fazer parte do novo Grupo Consultivo Técnico sobre Genômica (TAG-G), responsável por contribuir com o processo de aceleração do acesso ao conhecimento e às tecnologias genômicas, especialmente em países de baixo e médio rendimento. No total fazem parte do grupo 15 cientistas de diversos países.

O artigo GWAS meta-analysis of over 29,000 people with epilepsy identifies 26 risk loci and subtype-specific genetic architecture pode ser lido em: www.nature.com/articles/s41588-023-01485-w.

Físico brasileiro recebe prêmio do Departamento de Energia norte-americano

O físico Vinícius Njaim Duarte, ex-bolsista da FAPESP e pesquisador do Laboratório de Física de Plasma na Princeton University, Estados Unidos, ganhou um prêmio de US$ 2,5 milhões do Early Career Research Program Award, patrocinado pelo U.S. Department of Energy (DOE).

Duarte utilizará o financiamento de cinco anos para avançar na compreensão dos processos que levam à perda de partículas de alta energia em instalações de reatores Tokamak, equipamento projetado para aproveitar a energia fornecida pela reação de fusão nuclear.

“Sinto-me honrado em receber esse prêmio”, disse Duarte no portal do Laboratório de Física de Plasma de Princeton. “Isso proporcionará os recursos para a nossa equipe abordar uma importante lacuna de pesquisa para o International Thermonuclear Experimental Reactor [Iter] e dispositivos de fusão de próxima geração.”

O Iter é um projeto de reator experimental a fusão nuclear baseado na tecnologia do Tokamak, com o objetivo de atingir a próxima fase na evolução da energia nuclear, como meio de gerar eletricidade isenta de emissões radioativas. O dispositivo projetado combina elementos leves sob a forma de plasma para gerar enormes quantidades de energia.

O Early Career Award, que incluirá o apoio a dois pesquisadores pós-doutorandos, permitirá à equipe estudar o comportamento de partículas energéticas na presença de diferentes tipos de aquecimento externo e diferentes ondas que podem desestabilizar plasmas de fusão. O confinamento eficiente de tais partículas será essencial para o projeto de futuras usinas de fusão, segundo Duarte, diferente das atuais de fissão nuclear.

Produtos feitos de falso plástico biodegradável são vendidos em supermercados do país

Um estudo famoso publicado na revista Science mostrou que, até 2015, cerca de 6,3 bilhões de toneladas de polímeros plásticos haviam sido produzidos e descartados ao longo da história humana. Destes, apenas 9% foram reciclados e 12%, incinerados. Os 79% restantes foram acumulados em aterros sanitários ou em ambientes continentais, dos quais aproximadamente 10% alcançaram ambientes marinhos ou costeiros.

Os dados são de oito anos atrás. E, embora alguns países tenham anunciado políticas de “plástico zero”, a situação está certamente muito pior agora, por efeito cumulativo, uma vez que a produção anual é de 400 milhões de toneladas. Em consequência, a contaminação por microplásticos tornou-se, depois da crise climática, um dos maiores problemas ambientais do planeta. Há microplásticos em todos os lugares: na terra, no mar e no ar. Como afirma o pesquisador Ítalo Castro, professor do Instituto do Mar da Universidade Federal de São Paulo (IMar-Unifesp), “a gente só não encontra microplásticos onde não procura”. No corpo humano, eles já foram detectados no sangue, nos pulmões, no coração e na placenta.

O agravante é que aquilo que deveria ser uma solução muitas vezes constitui um problema a mais. É o que mostra uma investigação coordenada por Castro.

Pesquisadores do Instituto do Mar visitaram 40 supermercados do Brasil e analisaram os produtos supostamente feitos com plásticos biodegradáveis expostos à venda. Os estabelecimentos foram escolhidos entre grandes redes que atuam nos Estados de São Paulo e Rio de Janeiro. E um total de 49 produtos diferentes, incluindo sacolas, copos, pratos, talheres e outros utensílios de cozinha, foram encontrados. Esses itens eram, em média, 125% mais caros do que similares feitos de plásticos convencionais. A grande surpresa foi verificar que nenhum deles, mesmo os de grandes marcas, atendia aos requisitos mínimos para serem considerados de fato biodegradáveis.

O estudo teve como primeira autora a doutoranda Beatriz Barbosa Moreno, bolsista da FAPESP sob a orientação de Castro. Os resultados foram publicados no periódico Sustainable Production and Consumption.

“Para ser considerado biodegradável, um produto, quando descartado no meio ambiente, deve-se converter em água [H2O], gás carbônico [CO2], metano [CH4] e biomassa em um intervalo de tempo relativamente curto. Não há consenso sobre que intervalo de tempo é esse. Mas a ideia geral é que varie de algumas semanas a um ano. Nenhum dos 49 itens que investigamos atendeu a esse requisito”, diz Castro.

Segundo o pesquisador, mais de 90% deles eram feitos com uma classe de materiais que se convencionou chamar de oxodegradáveis. Apesar do nome, esses materiais não sofrem degradação em condições ambientais normais. São polímeros de origem fóssil aditivados com sais metálicos. Os sais aceleram o processo de oxidação e fragmentação. Mas os fragmentos podem permanecer por décadas na natureza. Além de não contribuir para a degradação, a fragmentação acelera a formação de microplásticos.

“Os plásticos oxodegradáveis já foram proibidos em vários locais do mundo, incluindo a União Europeia. Na maioria dos casos, as proibições ocorreram pela falta de evidências de biodegradabilidade em ambientes reais, associada ao risco de formação de microplásticos”, informa Castro.

Regulação

Como os plásticos oxodegradáveis ainda não são proibidos no Brasil, sua venda não constitui crime. No entanto, além da denominação capciosa, os consumidores são enganados pela alegação de muitas empresas de que seus produtos foram aprovados por normas técnicas e testes de biodegradabilidade, como ASTM D6954-4 ou SPCR 141. “Essas normas fornecem apenas um guia para comparar taxas de degradação e alterações de propriedades físicas sob condições controladas de laboratório, não avaliando as etapas finais da degradação. Aliás, nas páginas web das próprias normas, há advertências para que não sejam usadas em certificações de biodegradabilidade de produtos plásticos comerciais”, argumenta Castro.

O pesquisador ressalta que a comercialização de um produto que não entrega o prometido, do ponto de vista ambiental, pode ser enquadrada como prática de greenwashing, termo em inglês que indica falsas alegações ambientais em produtos comerciais.

“Quando um produto reconhecidamente prejudicial para o meio ambiente passa a ser maciçamente usado, é necessário que ações de Estado sejam implementadas. Nesse sentido, tramita na Câmara dos Deputados o projeto de lei 2524/2022 que, entre outras providências, veda o uso de aditivos oxidegradantes ou pró-oxidantes em resinas termoplásticas, assim como a fabricação, a importação e a comercialização de quaisquer embalagens e produtos feitos de plásticos oxidegradáveis”, informa Castro.

Caso aprovado no seu formato atual, diz o pesquisador, o PL 2524/2022 poderá contribuir para a transição do Brasil rumo a uma economia circular do plástico. “Essa transição é uma necessidade urgente”, enfatiza Castro. E prossegue: “O Instituto do Mar está localizado em Santos, no litoral paulista. Em Santos, detectamos microplásticos acumulados em ostras [Crassostrea brasiliana] e mexilhões [Perna perna]. Esses animais são filtradores da água do mar. Por isso, considerados o padrão-ouro para avaliação das condições do ambiente em que se encontram. Os valores que detectamos estão entre os maiores do mundo quando comparados a outros 40 estudos semelhantes”, conta (leia mais em: agencia.fapesp.br/41673).

Procurado pela reportagem, o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) afirmou em nota que apoia o PL 2524/22, mas com algumas alterações. “O ministério é favorável à proibição de aditivos oxidegradantes/pró-oxidantes, baseando-se em estudos que comprovam a geração de microplásticos na fragmentação de plásticos com tais aditivos – o que causa dano ambiental, particularmente para ambientes marítimos”, sublinhou o texto.

Já a Associação Brasileira da Indústria do Plástico (Abiplast) informou, também em nota, ser favorável à proibição da utilização do aditivo oxidegradável em produtos plásticos. Contudo, a entidade se coloca contrária ao PL 2524/2022, que, em sua avaliação, “confunde economia circular com banimento de produtos plásticos, direcionando o objeto da lei apenas a um único material”. O texto diz ainda que “a economia circular implica uma mudança sistêmica, portanto, exige uma abordagem macro, envolvendo todos os setores da indústria. Enquanto isso, outro PL, o 1874/2022 [que institui a Política Nacional de Economia Circular], traz disposições importantes, como a gestão estratégica dos recursos, a promoção de novos modelos de negócio, os investimentos em atividades de pesquisa e inovação e o apoio à transição para o uso de tecnologias de baixo carbono por meio da criação de condições atrativas para investimento público e privado, entre outros aspectos”.

“A Abiplast acredita no debate sério e preciso, com informações científicas, para que se possa promover um diálogo propositivo sobre a correta utilização do plástico e todos os benefícios que o material trouxe e traz para a sociedade. O setor plástico tem sido protagonista em ações para promover a economia circular do material, investindo em tecnologia, sustentabilidade e inovação”, afirmou a entidade.

O artigo High incidence of false biodegradability claims related to single-use plastic utensils sold in Brazil pode ser acessado em: www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S235255092300180X?via%3Dihub.

Descoberta de mecanismo envolvido em inflamação dentária abre caminho para terapias contra perda óssea

Por meio de experimentos com camundongos, pesquisadores desvendaram mecanismos envolvidos em inflamações na polpa dentária e em lesões periapicais (em torno da extremidade da raiz do dente), abrindo caminho para a busca de medicamentos que podem ser usados para inibir a perda óssea decorrente de infecção endodôntica. O mecanismo estudado envolve um receptor denominado TNFR1, no qual a citocina pró-inflamatória TNF-α se liga.

Em uma das situações avaliadas, a via de sinalização TNF-α-TNFR1 foi capaz de proteger e permitiu o reparo do dente, mas, em outro caso, gerou resposta em sentido diferente, levando a um processo inflamatório com perda óssea – a diferença foi a presença ou não de microrganismos.

Um dos estudos, publicado no Journal of Endodontics, mostrou que o receptor TNFR1 está envolvido na formação de dentina reparadora após a realização do chamado “capeamento” da polpa dentária, ou seja, a colocação de um material bioativo diretamente sobre o local exposto na tentativa de permitir a cicatrização da polpa.

Quando o TNFR1 é removido ou desativado geneticamente (processo conhecido como ablação), há uma alteração da resposta inflamatória e inibição da produção de proteínas-chave de mineralização (sialoproteína dentinária e osteopontina), levando à necrose da polpa dentária e ao desenvolvimento de periodontite apical. Com isso, os pesquisadores demonstraram, in vivo, que essa via de sinalização pró-inflamatória é importante para a diferenciação celular e síntese de proteínas que controlam o processo de biomineralização dentária – um caminho crucial para a cicatrização adequada dos dentes.

Já no outro trabalho, publicado na mesma revista, os cientistas observaram que a via de sinalização TNF-α-TNFR1 é responsável por mediar a degradação do tecido ósseo após a contaminação do canal radicular. Essa via desempenha um papel importante na inflamação e na perda óssea quando o canal radicular do dente está contaminado por microrganismos. Se houver o bloqueio dela, é possível reduzir os efeitos negativos.

“Nosso grupo tem trabalhado na investigação de mediadores biológicos envolvidos na diferenciação de células-tronco e biomineralização de dentes e ossos. Estudamos lesões periapicais, que são um tipo bem específico, quando há entrada de bactérias no canal radicular dos dentes, resultando em uma contaminação no canal”, afirma o professor da Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FORP-USP) Francisco Wanderley Garcia de Paula-Silva.

Os dois artigos são resultado do doutorado de Luciano Aparecido de Almeida Júnior no Programa de Pós-Graduação em Odontopediatria da FORP-USP, sob orientação de Paula-Silva. Ambos receberam apoio da FAPESP (19/00204-1 e 19/02432-1).

Recentemente, o grupo ligado ao professor também publicou um artigo direcionado e revisado por crianças para explicar o processo de regeneração dos dentes, com ênfase nas células e moléculas envolvidas neste mecanismo. Além disso, eles mantêm um canal no YouTube sobre “alfabetização” em saúde bucal (leia mais em: agencia.fapesp.br/41826).

Entre crianças e adolescentes, as cáries são o principal problema bucal, segundo dados preliminares da Pesquisa Nacional de Saúde Bucal, que vem sendo realizada pelo governo federal. O levantamento mostra ainda que cerca de 45% dos idosos de 65 a 74 anos precisam de algum tipo de tratamento imediato, devido à dor ou infecção dentária, e, entre adultos (de 35 a 44 anos), foi identificada a necessidade de ao menos um procedimento odontológico eletivo em 48% da população avaliada.

Passos

Na pesquisa que envolveu a formação de dentina reparadora, os cientistas compararam as respostas de reparo da polpa dentária de camundongos geneticamente deficientes do receptor-1 de TNF-α com roedores “selvagens” (linhagem C57Bl6). O capeamento da polpa foi realizado com agregado de trióxido mineral. Após sete e 70 dias, os tecidos foram coletados para avaliação.

Nessa situação (falta do receptor TNFR1), a resposta inflamatória gerada foi muito grande, resultando na perda óssea com recrutamento de células que fazem essa reabsorção do tecido.

No estudo que avaliou a via de sinalização TNF-α-TNFR1 frente à infecção, os pesquisadores induziram a periodontite apical por meio da inoculação de microrganismos orais nos canais radiculares de molares dos camundongos e compararam com o grupo de controle após sete, 14, 28 e 42 dias.

Foram realizadas análises por microtomografia computadorizada – com a participação do Laboratório de Pesquisa em Endodontia da FORP-USP –, avaliação histopatológica, histomicrobiológica e histométrica. A conclusão foi de que os roedores deficientes de TNFR1 exibiram menor recrutamento de neutrófilos aos 14, 28 e 42 dias, resultando em diminuição da área e do volume da periodontite apical aos 42 dias.

O número de osteoclastos – células responsáveis pela reabsorção óssea por meio da desmineralização e degradação da matriz do osso – também foi menor nestes animais aos 14 e 42 dias.

Paula-Silva diz que seu grupo vem agora buscando perspectivas terapêuticas com base nos achados das duas pesquisas. “Com esses resultados, percebemos que, se bloquearmos essa resposta inflamatória, inibindo o receptor, podemos trabalhar em um protocolo de tratamento. Estamos na fase inicial, ainda em modelo animal, mas é um alvo bem interessante”, complementa o professor em entrevista à Agência FAPESP.

Os artigos Reparative Dentin Formation Following Dental Pulp Capping is Mediated by TNFR1 In Vivo e TNF-α-TNFR1 Signaling Mediates Inflammation and Bone Resorption in Apical Periodontitis podem ser lidos, respectivamente, em: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/37423584/ e https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/37499863/.

Projeto propõe criar plataforma baseada em inteligência artificial para ajudar no combate a epidemias

Como os avanços em inteligência artificial (AI) e ciência de dados podem contribuir para o combate à propagação de doenças infecciosas e o aprimoramento da saúde pública em países de baixa e média renda? Dezesseis projetos de pesquisa que buscam responder a esse questionamento foram selecionados em uma chamada de propostas lançada pela Global South Artificial Intelligence for Pandemic and Epidemic Preparedness and Response Network (AI4PEP) e receberão financiamento da Universidade York e do Centro Internacional de Pesquisa para o Desenvolvimento do Ministério de Desenvolvimento Internacional, ambos do Canadá.

Um dos projetos aprovados, intitulado “AutoAI-Pandemics: Democratizing Machine Learning for Analysis, Study, and Control of Epidemics and Pandemics”, é de autoria do professor André Carlos Ponce de Leon Ferreira Carvalho, pesquisador principal do Centro de Ciências Matemáticas Aplicadas à Indústria (CeMEAI), e do seu aluno de doutorado Robson Parmezan Bonidia.

O CeMEAI é um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID) da FAPESP sediado no Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação da Universidade de São Paulo (ICMC-USP), em São Carlos.

“Embora a IA crie novas oportunidades, seu uso adequado requer conhecimentos avançados de computação, estatística e matemática, limitando seu uso por não especialistas, por exemplo, biólogos, médicos e epidemiologistas. Nosso objetivo é desenvolver uma plataforma integrada e fácil que possa ser efetivamente empregada por não especialistas que trabalham com doenças infecciosas. Essa plataforma, denominada AutoAI-Pandemics, fornecerá soluções robustas usando aprendizado de máquina automatizado (automated machine learning) para análise epidemiológica capaz de detectar possíveis cenários epidêmicos e recomendar intervenções para suprimir com segurança a propagação de doenças, com o mínimo impacto social; análise de bioinformática, ajudando pesquisadores das ciências da vida com a análise do genoma do patógeno e combatendo a desinformação para auxiliar na busca de fontes confiáveis de informação”, descreveram Carvalho e Bonidia no estudo submetido.

Ainda segundo eles, a plataforma poderá trabalhar em vários estágios críticos de uma epidemia/pandemia. “O AutoAI-Pandemics pode ser usado por formuladores de políticas públicas e outras partes interessadas, profissionais de saúde, indústrias farmacêuticas, organizações de vigilância genômica e para combater a desinformação”, explica Robson Bonidia, que tem a bioinformática como uma das principais áreas de seu doutorado.

Seus trabalhos receberam o Latin America Research Awards (LARA) em 2021, promovido pelo Google. Ele também foi finalista (Top 15 de 82) do Falling Walls Lab Brasil 2022, promovido pela Falling Walls Foundation, Centro Alemão de Ciência e Inovação.

“A maior riqueza desse projeto está na democratização da IA, de podermos agregar estudos e pesquisadores de várias áreas do conhecimento em uma interface simples e que não necessite embasamento matemático específico para sua atualização, podendo beneficiar milhares de pessoas”, comenta o pesquisador.

Sobre o financiamento, Bonidia lembra que contribuirá na contratação de mais especialistas de universidades brasileiras e do exterior, interessados em trabalhar no projeto que tem duração de quatro anos.

“Com esse trabalho, estamos melhorando os serviços de saúde e permitindo que mais pessoas tenham acesso a saúde gratuita e de qualidade. Os recursos, da ordem de R$ 1,3 milhão, serão utilizados pela equipe brasileira em bolsas, equipamentos, treinamentos e workshops”, destaca Carvalho.

* Com informações do CeMEAI, um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão da FAPESP.

Estudo ajuda a entender como a radiação ionizante danifica o DNA

A radiação ionizante (como, por exemplo, os raios X) em altas doses pode danificar o DNA presente no núcleo celular – algo que pode tanto levar ao desenvolvimento de câncer em humanos como ser explorado para matar células cancerígenas. Esse dano ao DNA se dá por meio de dois mecanismos: um direto, em que a partícula ionizante impacta fisicamente a molécula, e outro indireto, em que espécies químicas produzidas pela radiólise da água (quebra das ligações de hidrogênio entre moléculas de H2O) atacam os ácidos nucleicos.

Em trabalho publicado no International Journal of Molecular Sciences, pesquisadores brasileiros investigaram esse segundo mecanismo. O objetivo foi entender como um tipo de radical livre – chamado radical hidroxila (OH) – afeta o nucleotídeo guanina, causando a dissociação dessa molécula.

A guanina (G) é uma das bases nitrogenadas que formam os nucleotídeos constituintes das moléculas de DNA e RNA, assim como a adenina (A), a citosina (C) e a timina (T).

Para estudar esse mecanismo, o grupo recorreu ao método da Teoria Funcional da Densidade Dependente do Tempo – que é parte da mecânica quântica e permite descrever propriedades eletrônicas na física do estado sólido, química quântica, ciência dos materiais, bioquímica, biologia, nanossistemas e sistemas em escala atômica.

Os pesquisadores concluíram que a abstração de hidrogênio foi exitosa em ataques a diferentes átomos de oxigênio, dissociando o DNA em três fragmentos principais: o grupo fosfato, o açúcar desoxirribose e a base nitrogenada. Segundo os autores, os cálculos descritos no artigo podem ser uma referência para ajustar campos de força reativos para que estruturas mais complexas de DNA possam ser estudadas usando dinâmica molecular clássica, incluindo danos diretos e indiretos ao DNA.

O trabalho envolveu pesquisadores do Centro de Desenvolvimento de Materiais Funcionais (CDMF) – um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID) da FAPESP sediado na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) – e do Instituto de Física Gleb Wataghin da Universidade Estadual de Campinas (IFGW-Unicamp). Recebeu financiamento da FAPESP por meio de três projetos (18/15316-7, 20/08647-7 e 15/21873-8).

O artigo A TD-DFT-Based Study on the Attack of the OH· Radical on a Guanine Nucleotide pode ser lido em: www.mdpi.com/1422-0067/23/17/10007.

* Com informações do CDMF, um Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão da FAPESP.

Ciclo do carbono durante o último período glacial pode ajudar a monitorar a crise climática

As trocas gasosas entre a atmosfera e os oceanos são um componente importante do ciclo do carbono, desempenhando papel vital na regulação do clima e na manutenção do equilíbrio ecológico do planeta. Estima-se que os oceanos absorvam aproximadamente um terço do dióxido de carbono (CO2) emitido pela humanidade. Por isso, compreender os processos complexos que regem essas trocas gasosas é de extrema importância – ainda mais agora, no contexto da crise climática global.

Um estudo recente investigou os processos que regeram os fluxos gasosos entre a atmosfera e o oceano Atlântico Sul no passado geológico recente. E revelou um marcante equilíbrio natural nas trocas de CO2, mesmo sob um cenário de mudanças climáticas abruptas. O estudo, financiado pela FAPESP, foi publicado na revista Global and Planetary Change.

“Investigamos períodos do passado geológico recente nos quais o clima global sofreu mudanças abruptas causadas pela redução da intensidade da Célula de Revolvimento Meridional do Atlântico [AMOC, na sigla em inglês]. Esses eventos são conhecidos como Heinrich Stadials (HS), em homenagem ao climatologista alemão Hartmut Heinrich, conta Tainã Pinho, autor correspondente do trabalho – fruto de seu projeto de mestrado conduzido no Instituto de Geociências da Universidade de São Paulo (IGC-USP).

Como a AMOC é responsável por transportar substancial quantidade de calor do Atlântico Sul para o Atlântico Norte, uma redução na sua eficiência gera resfriamento no Atlântico Norte e acúmulo de calor no Atlântico Sul. Uma importante consequência do aquecimento da porção meridional do Atlântico foi o aumento da ressurgência marinha no oceano Austral, que circunda a Antártica. A ressurgência é a subida das águas profundas para a superfície. Sua intensificação fez com que o Oceano Austral liberasse grande quantidade de CO2, que estava aprisionada no fundo oceânico, para a atmosfera. Esse CO2 oriundo do oceano profundo possui uma “impressão digital” que permite distingui-lo do CO2 oriundo de outras fontes.

Toda essa história ficou, de certa forma, gravada nos sedimentos marinhos. “Nosso estudo foi baseado em análises de microconchas de foraminíferos planctônicos, preservadas em três testemunhos sedimentares marinhos. Dois deles foram coletados na costa brasileira, nos Estados de Alagoas e Santa Catarina, e o terceiro foi coletado ao largo da África do Sul. As análises das microconchas permitiram reconstituir e compreender um importante elo nas trocas gasosas entre a atmosfera e o Atlântico Sul durante os eventos HS”, diz Pinho.

Segundo o pesquisador, “as análises isotópicas realizadas e os resultados de modelagem matemática indicaram que o carbono oriundo do fundo oceânico é primeiro transferido do oceano Austral para a atmosfera e, posteriormente, entra em equilíbrio com a porção superior do Atlântico Sul”.

Essa compreensão foi possível mediante o estudo da composição dos isótopos estáveis do carbono presentes nas microconchas, que são formadas principalmente por carbonato de cálcio (CaCO3). Isótopos estáveis são átomos de um elemento químico que têm o mesmo número de prótons, mas números diferentes de nêutrons em seus núcleos, e não sofrem decaimento radioativo. No caso do carbono, processos naturais como a fotossíntese dão preferência pela incorporação na matéria orgânica de um isótopo em detrimento do outro. E, quando os organismos que produzem fotossíntese no topo do oceano morrem, eles afundam na coluna de água e sofrem degradação em grandes profundidades. Então, o isótopo que foi preferencialmente incorporado é novamente liberado para o pool de CO2 das águas do oceano profundo, gerando assim a tal “impressão digital”.

“A partir da comparação entre a composição isotópica das microconchas obtidas nos três testemunhos sedimentares marinhos e a composição isotópica do CO2 atmosférico registrada nos testemunhos de gelo da Antártica, pudemos concluir que o Atlântico Sul registrou aumentos do CO2 atmosférico durante os eventos HS”, afirma Pinho.

Os pesquisadores observaram excesso de um dos isótopos estáveis do carbono – mais precisamente do carbono 12, também chamado de “carbono leve” – durante os eventos HS. E essa é a “impressão digital” do CO2 do oceano profundo. As microconchas detectaram a emissão de CO2 com excesso de carbono 12 do fundo oceânico da região austral para a atmosfera que, então, entrou em equilíbrio com a camada superficial do Atlântico Sul.

“Esse equilíbrio não se limitou aos primeiros metros da coluna de água, mas alcançou profundidades de, pelo menos, 300 metros. Por meio deste equilíbrio, a ‘impressão digital’ do CO2 do oceano profundo foi transferida para a porção superficial do Atlântico Sul”, acrescenta Pinho.

Atualmente, existe um crescente grupo de evidências que indica o enfraquecimento, ou até mesmo o colapso, da AMOC até o final deste século. Além do aquecimento global em curso, isso poderá causar um aquecimento adicional do Atlântico Sul, repercutindo no clima planetário.

“Como a solubilidade do CO2 na água diminui à medida que a temperatura da água aumenta, o aquecimento pode reduzir a capacidade de os oceanos absorverem CO2, desconectando, pelo menos parcialmente, os oceanos da atmosfera. Esse importante desequilíbrio poderá ser rastreado por meio da composição isotópica do carbono do CO2 na água do oceano, de maneira análoga ao que foi feito no estudo aqui reportado”, comenta o professor Cristiano Chiessi, orientador da pesquisa de Pinho no IGc-USP e coautor do artigo.

A compreensão das bases e dos limites naturais do ciclo do carbono integrando a atmosfera e os oceanos no passado deve enriquecer os cenários sobre as mudanças climáticas em curso. O eventual desacoplamento entre esses dois importantíssimos reservatórios de carbono, a atmosfera e o oceano, é algo a ser monitorado com a máxima atenção. “A composição dos isótopos estáveis de carbono em foraminíferos planctônicos é de interpretação complexa, mas pode fornecer pistas relevantes para a compreensão de aspectos específicos do ciclo do carbono”, pontua Chiessi.

O orientador ressalta que, além das conclusões alcançadas, o estudo constituiu um notável esforço laboratorial, levantando novos registros de três porções distintas do Atlântico Sul, com mais de 940 análises.

O estudo recebeu financiamento da FAPESP por meio de três projetos (19/10642-6, 18/15123-4 e 19/24349-9) e foi conduzido no âmbito dos programas de Pesquisas em Caracterização, Conservação, Restauração e Uso Sustentável da Biodiversidade (BIOTA) e de Pesquisa em Mudanças Climáticas Globais (PFPMCG).

O artigo Thermodynamic air-sea equilibration controls carbon isotopic composition of the South Atlantic thermocline during the last glacial period pode ser acessado em: www.sciencedirect.com/science/article/abs/pii/S0921818123001960?via%3Dihub.

Fungicida à base de óleos essenciais combate pragas da cultura de soja

Pesquisadores da Linax, empresa com sede em Votuporanga, no interior de São Paulo, desenvolveram um fungicida à base de óleos essenciais, com baixo impacto ambiental e alto potencial econômico, contra pragas que acometem as culturas de soja no Brasil.

A solução, desenvolvida por meio de um projeto apoiado pelo Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE), da FAPESP, consiste em uma mistura de óleos extraídos de diferentes plantas. A solução é encapsulada por polímeros naturais, que liberam a substância de forma lenta e prolongada, ampliando seu período de ação na lavoura e diminuindo o risco dessas pragas desenvolverem algum tipo de resistência ao produto.

Protótipos da tecnologia foram testados contra o fungo Phakopsora pachyrhizi, causador da ferrugem asiática, uma das doenças mais severas que incidem na cultura da soja no país. O patógeno ataca as folhas da planta, afetando sua capacidade de realizar fotossíntese e de formar grãos saudáveis. Se não controlada adequadamente, chega a inviabilizar até 90% da plantação, gerando prejuízos que podem alcançar os bilhões de reais.

A solução desenvolvida pela Linax apresentou efeito equivalente ao dos fungicidas mais usados no combate dessa praga no Brasil. “A aplicação conjunta de metade da dose da nossa solução mais metade da dose dos fungicidas convencionais apresentou eficácia superior à dos convencionais aplicados de modo isolado”, conta o engenheiro agrônomo Nilson Borlina Maia, sócio-proprietário da Linax. “Isso significa que seria possível diminuir o uso dos fungicidas convencionais, que são nocivos à saúde humana, animal e ao meio ambiente, adicionando a eles uma dose da nossa solução à base de óleos essenciais”, avalia.

A tecnologia resulta de uma parceria entre a Linax e o Grupo Santa Clara, empresa de insumos agrícolas com sede em Ribeirão Preto, interior de São Paulo. O grupo recentemente anunciou a incorporação da firma de Votuporanga à Santa Clara Agrociência, sua spin-off com foco em biodefensivos.

O fungicida da Linax deve ser lançado ainda este ano. Segundo Maia, a empresa pretende usar a estratégia contra fungos que causam doenças em outras culturas.

Eles também trabalham em soluções ambientalmente sustentáveis para ampliar a eficácia de defensivos biológicos. “Estamos desenvolvendo um projeto com a Unesp [Universidade Estadual Paulista] para encapsular fungos e bactérias usados no controle de pragas e doenças que afetam as lavouras, de modo a protegê-los dos raios ultravioleta e aumentar sua viabilidade e eficácia”, afirma o engenheiro agrônomo.

Histórico de inovações

A Linax tem um amplo histórico de inovações baseadas em óleos essenciais e polímeros naturais, muitas delas desenvolvidas com apoio do PIPE e do Programa de Apoio à Pesquisa em Empresas (PAPPE), promovido pela FAPESP em parceria com a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep).

A própria empresa nasceu de um projeto apoiado pelo PIPE-FAPESP, iniciado em 2004 e voltado à extração de óleo de linalol de folhas de manjericão (Ocimum basilicum).

Essa substância é amplamente utilizada pela indústria perfumista, sendo o principal ingrediente do perfume francês Chanel nº 5. Por muito tempo foi extraída da madeira do pau-rosa (Aniba rosaeodora), árvore nativa da Amazônia, o que quase levou a espécie à extinção.

Estima-se que cerca de 2 milhões de árvores tenham sido derrubadas para extração do óleo de linalol até 2002, de modo que sua área de ocorrência atualmente se restringe a alguns poucos municípios do Estado do Amazonas, como Parintins, Maués, Presidente Figueiredo e Novo Aripuanã.

A pesquisa que deu início ao projeto e à empresa teve início anos antes, em 1998, quando o pesquisador iniciou um estudo comparativo com 18 plantas que contêm linalol, entre elas coentro, louro, canela e laranja, além do manjericão. “O objetivo era encontrar uma alternativa à extração do óleo de pau-rosa”, diz Maia.

O louro foi logo descartado. “Apesar de apresentar alto índice desse óleo essencial, a árvore demora muito tempo para ficar adulta, o que inviabiliza seu cultivo para extração comercial”, explica Maia. “Por sua vez, o coentro e a canela não apresentaram linalol, enquanto a laranja possuía baixo índice da substância”, compara.

Apesar de não ter conseguido encontrar uma planta que tivesse um óleo tão rico em linalol como a madeira do pau-rosa, que chega a 90%, Maia conseguiu no manjericão um óleo natural, economicamente viável, capaz de substituir o linalol natural em muitas formulações de cosméticos, perfumes e outros produtos de higiene e beleza.

O projeto, que à época contou com a colaboração e o apoio do Instituto Agronômico (IAC), viabilizou a produção de mudas em larga escala, para que em pouco tempo fosse possível instalar lavouras comercialmente viáveis para produzir manjericão.

Para facilitar o trabalho de extração de óleo essencial em laboratório, Maia desenvolveu um minidestilador feito de aço inoxidável, que não libera resíduos tóxicos que possam comprometer a qualidade do produto. “Nos aparelhos convencionais, feitos de vidro e de difícil manuseio, o trabalho de carregar e descarregar o material vegetal leva em média uma hora”, explica. “Com o minidestilador que criamos, a mesma tarefa demora cerca de um minuto e a destilação é controlada por um sistema elétrico automatizado”, compara.

A novidade, apresentada no 3º Simpósio Brasileiro de Óleos Essenciais, realizado em Campinas em novembro de 2005, abriu novas frentes de negócio para a empresa. “Passamos a fabricar e a comercializar destiladores de óleos essenciais para laboratórios científicos, empresas de perfumaria e produtores rurais de pequeno, médio e grande porte. Desde então, já vendemos mais de 200 desses equipamentos”, afirma.

Em 2020, a Linax conseguiu obter recursos da FAPESP e da Finep, por meio do Programa PIPE-PAPPE Subvenção, para desenvolver um sistema de controle automatizado de seus destiladores baseado em softwares de inteligência artificial. “O sistema é capaz de controlar e monitorar todo o processo de destilação de óleos, aumentando sua eficiência”, diz.

A empresa hoje domina todas as etapas da tecnologia de produção de linalol, auxiliando seus clientes na produção de mudas com variedades adequadas, no cultivo e na colheita da planta e na destilação para obtenção de um óleo com até 95% de pureza, viabilizando a produção econômica, social e ambientalmente sustentável.

“A Linax também ajuda seus clientes a dominar a produção de outros óleos essenciais, os quais podem ser usados no desenvolvimento de novos produtos que ainda não existam no mercado”, sublinha Maia.

A estratégia, segundo o engenheiro agrônomo, oferece possibilidades concretas de ganho à agricultura familiar da região de Votuporanga, ajudando a consolidar um novo segmento no agronegócio: a exploração de óleos essenciais.

MCTI participa de debate sobre cooperação científica na Antártica

O Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) participou da 34ª Reunião de Administradores de Programas Antárticos Latino-Americanos, em Lima, no Peru, sobre cooperação científica e uso compartilhado entre infraestrutura de pesquisa. O encontro, que terminou na quinta-feira (7), reuniu representantes da Argentina, Brasil, Chile, Uruguai, Equador, Peru, Colômbia e Venezuela.

O diretor do Departamento de Programas Temáticos da Secretaria de Políticas e Programas Estratégicos do MCTI, Leandro Pedron, apresentou as ações do Brasil continente antártico, como o plano estratégico brasileiro para os próximos 10 anos de pesquisa na antártica; a instalação do módulo automatizado Criosfera 2; e a contratação de projetos de pesquisa.

Na reunião, também foram discutidos o acesso facilitado e unificado aos dados dos projetos de pesquisa; o esforço colaborativo para avaliação de microplásticos no continente antártico; medidas de prevenção e controle de gripe aviária; e o monitoramento da dinâmica populacional do krill e a sua ligação com as alterações climáticas.

De acordo com o diretor do MCTI, os debates são fundamentais para a geração de conhecimento brasileiro na Antártica. “Essas recomendações, como resultados das discussões da reunião da RAPAL, impactam a gestão das atividades da ciência brasileira na Antártica, ações de responsabilidade direta do MCTI, uma vez que as medidas adotadas são legalmente vinculantes e dizem respeito, principalmente, às atividades de ciência e tecnologia na Antártica”, destacou.

O evento, organizado pela Diretoria de Assuntos Antárticos do Ministério das Relações Exteriores do Peru, ocorre anualmente. A próxima edição, em 2024, será realizada no Brasil.

Também participaram o secretário da Comissão Interministerial para os Recursos do Mar (SeCIRM) e gerente do Programa Antártico Brasileiro (Proantar), contra-almirante Ricardo Jaques Ferreira, que chefiou a delegação brasileira, o subsecretário para o Proantar, Francisco Leonardo Maciel Machado, e a representante da divisão de Relações Internacionais do Proantar, Haynnee Trad Souza; a chefe da Divisão do Mar, da Antártica e do Espaço do Itamaraty, Maitê de Souza Schmitz; a coordenadora-geral de Ciências para Oceano e Antártica do MCTI,  Andréa Cancela da Cruz, e a coordenadora dos Programas de Pesquisa em Ciências Ambientais e do Mar do CNPq, Margareth Alves Carvalho.

Informações sobre a ciência brasileira na Antártica estão disponíveis em: https://cienciaantartica.mcti.gov.br/

Projeto do Insa transforma cacto cultivado no semiárido em doces e geleias

Um projeto desenvolvido no Instituto Nacional do Semiárido (Insa), unidade de pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) em Campina Grande (PB), está transformando a palma forrageira (Opuntia sp.) em ingrediente para a produção de alimentos saudáveis, sustentáveis e de alta qualidade. Por suprir parte das necessidades de energia e água dos rebanhos do semiárido, onde é amplamente cultivada, a palma forrageira é uma espécie de cacto utilizado, predominantemente, para alimentação animal.

“A utilização da palma na alimentação humana é bastante diversificada, incluindo tanto o consumo dos frutos (figo-da-índia) como dos brotos. Os frutos são consumidos geralmente in natura ou utilizados para produção de sucos, compotas, geleias e sorvetes. Já os brotos da palma são consumidos como verdura ou usados para fazer doces, sucos e tortas”, explicou a pesquisadora do Insa Jucilene Silva Araújo.

Segundo ela, o consumo da palma oferece muitos benefícios para a saúde. Rica em nutrientes, como vitaminas A, B e C, e minerais, como cálcio, magnésio e potássio, a palma forrageira também possui 17 tipos de aminoácidos, além de propriedades diuréticas e anti-inflamatórias. O valor nutricional a torna uma alternativa eficaz para combater a fome e a desnutrição.

Ainda de acordo com Jucilene Araújo, mesmo com muitos benefícios, culturalmente, o consumo da palma forrageira não é comum, mas, em alguns municípios da Bahia, o broto da palma já entrou na dieta alimentar da população, chegando a ser comercializado em feiras livres.

Confira, na tabela abaixo, os produtos desenvolvidos e que estão em fase de desenvolvimento no Insa a partir da palma forrageira. Todos os produtos desenvolvidos estão em fase de pedido de patente.

MCTI vai participar da VI Conferência Nacional Infanto Juvenil pelo Meio Ambiente

OMinistério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) vai participar da VI Conferência Nacional Infanto Juvenil pelo Meio Ambiente (CNIJMA). O convite foi feito, nesta quarta-feira (6), durante reunião entre a ministra do Meio Ambiente e da Mudança do Clima (MMA), Marina Silva, e a titular do MCTI, Luciana Santos.  A iniciativa do MMA também agrega o Ministério da Educação (MEC).

Prevista para ocorrer entre junho e julho de 2024, a conferência é um processo pedagógico que busca fortalecer a educação ambiental a partir dos estabelecimentos de ensino, além de propiciar atitude responsável e comprometida da comunidade escolar e contribuir com os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS). “Esse convite está mais do que aceito”, afirmou a ministra Luciana Santos, durante audiência.

A iniciativa, que teve início em 2003, é direcionada para estudantes que cursam o Ensino Fundamental II, de 11 a 14 anos, e tem, nas escolas seu pontapé inicial. Em seguida, passa para as esferas municipal, estadual e nacional. Desde sua criação, já envolveu mais de 20 milhões de pessoas.  “É muito importante ter essa interface com o MCTI. A conferência diz respeito à Pasta em diversos aspectos, como em relação ao tema, que envolve mudança climática”, pontuou a ministra Marina Silva.

Outro aspecto importante é o incentivo à mobilização sobre a dimensão política e social da questão ambiental, além de sua inserção e apropriação pelos sistemas de ensino nas dimensões de gestão, currículo e infraestrutura das unidades escolares. Para além da transversalidade do tema, a junção com o MCTI também poderia ser uma oportunidade de agregar o conhecimento desenvolvido pelo Programa Cemaden Educação.

Seminário

Outro ponto abordado durante a reunião foi a realização de um Seminário sobre Mudança Climática. A ideia seria trazer a ciência climática para o debate, além de abordar aspectos de políticas públicas para auxiliar municípios em casos de emergências e desastres naturais.  “Temos que olhar para a causa, por isso é tão importante a ciência, para não criar soluções ilusórias”, comentou Marina Silva.

A ministra Luciana Santos lembrou do trabalho realizado pelo Cemaden e defendeu a necessidade da união de vários ministérios e de um conjunto de ações nos municípios, que envolvam estimular uma “cultura de planejamento”, estruturar Defesa Civil, desenvolver ações de conscientização e educação, além de auxílios financeiros para as pessoas poderem deixar suas casas em áreas de risco, entre outros.

MCTI e CNPq anunciam adicional de bancada para bolsistas nível 2 de produtividade em pesquisa e desenvolvimento tecnológico

Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) anunciam a inclusão de adicional de bancada para as Bolsas de Produtividade em Pesquisa (PQ) e Bolsas de Produtividade em Desenvolvimento Tecnológico e Extensão Inovadora (DT), no nível 2.  A novidade foi publicada nesta quarta-feira (6) no Diário Oficial da União (DOU) pela Portaria CNPq nº 1.425, que dá nova redação à Tabela de Valores, acrescentando, às bolsas PQ e DT nível 2, o adicional de R$ 1.000,00. Os efeitos financeiros da nova tabela vigoram já a partir deste mês de setembro.

As bolsas PQ e DT são modalidades do mais alto nível entre as concedidas pelo CNPq, destinadas a pesquisadores de alta produtividade científica, em todas as áreas do conhecimento.

Para a ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, a implementação do adicional de bancada para bolsistas de Produtividade em Pesquisa e Desenvolvimento Tecnológico de nível 2 representa um investimento direto no fomento à pesquisa. “Sobretudo, avança na correção de uma distorção no sistema de bolsas do CNPq, promovendo o equilíbrio entre os pesquisadores de alto nível, que oferecem contribuição inestimável ao país”, ressalta.

O presidente do CNPq, Ricardo Galvão, explica que o adicional de bancada é um recurso que cada pesquisador PQ ou DT recebe de forma exclusiva para pequenas despesas na pesquisa. “Então é um investimento que é feito diretamente no fomento à pesquisa”, diz Galvão.

Ele lembra que o adicional da taxa de bancada foi introduzido em 2003, mas não para todos os pesquisadores. Havia uma faixa de bolsistas que não recebia esse recurso adicional. “A medida não é só de impacto financeiro, de investimento. Ela visa também buscar maior equilíbrio no sistema de bolsas, porque são todos pesquisadores com níveis de excelência muito parecidos”, completa.

MCTI e CNI coordenarão grupo de trabalho sobre inventários organizacionais no âmbito do Comitê Técnico da Indústria de Baixo Carbono

OMinistério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e a Confederação Nacional da Indústria (CNI) coordenarão o grupo de trabalho sobre inventários organizacionais. A agenda para o novo ciclo de atividades tem foco em capacitação, preparando as empresas para o exercício de mensuração de emissões de gases de efeito estufa e utilização da plataforma SIRENE Organizacionais. O grupo de trabalho foi reinstalado nesta terça-feira (5), em Brasília, durante a sessão do Comitê Técnico da Indústria de Baixo Carbono.

O SIRENE Organizacionais é um módulo do Sistema de Registro Nacional de Emissões, que foi instituído por decreto em 2017 e que reúne as informações oficiais do Brasil sobre emissões e remoções de gases de efeito estufa (GEE). A perspectiva é que o novo módulo seja lançado até o final do ano.

A concretização de uma plataforma em âmbito federal é um passo relevante também para que as empresas se preparem para atuar em um futuro mercado de carbono. A estruturação do sistema demandará bases técnicas e de dados que atendam metodologias internacionalmente reconhecidas e apresentem informações íntegras.

Ao explicar as atividades do grupo de trabalho, o coordenador-geral de Ciência do Clima do MCTI, Márcio Rojas, destacou que, durante o desenvolvimento da plataforma, houve a preocupação com bases de dados para mercado de carbono. “Teremos condições de adequar a plataforma com agilidade. Da nossa parte, estamos preparados para lidar com os desafios que possam surgir e fundamentalmente nos colocar à disposição com a melhor ciência disponível para atender as demandas”, afirmou.

Na avaliação do secretário de Economia Verde, Descarbonização e Bioindústria do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), Rodrigo Rollemberg, a atuação do grupo de trabalho para inventários organizacionais e a nova plataforma têm um papel importante. “Será fundamental para o país e também para o mercado de carbono”, ressaltou.

Na mesma perspectiva, o gerente-executivo de Meio Ambiente e Sustentabilidade da CNI, Davi Bontempo, destacou a relevância da agenda. “É uma pauta importante quando se avizinha o mercado de carbono”, disse.

Representantes de instituições destacaram a importância dos inventários organizacionais para estabelecer planos e metas setoriais de redução de emissões.  Cláudia Dias, do Instituto de Mineração do Brasil (Ibram), informou que os trabalhos desenvolvidos no grupo técnico auxiliaram a instituição a desenvolver seus inventários organizacionais. “Auxiliou no desenvolvimento do plano de mineração de baixo carbono”, relatou.

Ciclos

Nos quatro ciclos anteriores, o grupo de trabalho sobre inventários organizacionais se debruçou sobre questões metodológicas, verificação e submissão, além de ferramentas de TI para o desenvolvimento da plataforma pública de relato de GEE. Participaram das atividades diversos ministérios, associações e empresas, secretarias e agências subnacionais, entre outras iniciativas, como o CDP e WRI. O diálogo interinstitucional foi fundamental para contemplar as demandas e as percepções de diferentes atores para a construção do novo módulo para que as empresas possam efetivamente enviar seus relatórios.

Planta-piloto para produzir combustível sustentável de aviação contribui para descarbonização da economia

A primeira planta-piloto no Brasil para produzir combustível sustentável de aviação (SAF, na sigla em inglês), inaugurada na terça-feira (5), conta com o apoio do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). O Laboratório de Hidrogênio Verde e Combustíveis Avançados, instalado no Instituto SENAI de Inovação em Energias Renováveis (ISI-ER), em Natal (RN), deverá produzir 5 litros/dia do combustível, além de fazer estudos sobre a viabilidade e análises sobre os aspectos técnicos necessários para a produção.

O secretário de Desenvolvimento Tecnológico e Inovação do MCTI, Guila Calheiros, afirmou que a inauguração do laboratório é um marco significativo na jornada brasileira rumo à transição energética justa e inclusiva. Segundo ele, a primeira planta piloto de combustível sustentável de aviação contribui para os objetivos brasileiros relacionados à descarbonização da economia, principalmente no setor de aviação.

Guila Calheiros destacou que o MCTI tem atuado de forma assertiva nas áreas de energias renováveis, combustíveis sustentáveis e das tecnologias de baixo carbono. “O etanol e o biodiesel são exemplos da atuação conjunta do MCTI com ICTs e o setor privado, que resultou em programas que geraram grandes benefícios econômicos, sociais e ambientais para o país”, reforçou o secretário.

O laboratório foi estruturado por meio de uma parceria entre o Instituto Senai de Inovação e a Cooperação Técnica Brasil-Alemanha para o Desenvolvimento Sustentável (GIZ, na sigla em alemão), com apoio de dois convênios:  o ProQR – Combustíveis Alternativos Sem Impactos Climáticos, liderado pelo MCTI, e o H2Brasil, em colaboração com o Ministério de Minas e Energia (MME). Os convênios investiram um total de 1,4 milhão de euros (R$ 7,4 milhões) no projeto, sendo R$ 3,5 milhões por parte do ProQR/MCTI

Impactos climáticos

A Secretaria de Desenvolvimento Tecnológico e Inovação (Setec) do MCTI apoiou desde o princípio a iniciativa do laboratório. No âmbito do projeto ProQR foi realizado o estudo inicial Geração de Combustíveis Sintéticos de Aviação a partir da Glicerina Oriunda da Produção de Biodiesel. O trabalho demonstra como a bem-sucedida expansão da indústria de biocombustíveis no Brasil, que cria uma abundância de glicerol como subproduto, pode ser bastante importante também para a produção de combustíveis sintéticos para a aviação.

O estudo aponta que, além da possibilidade de diversificar a oferta de combustíveis mais sustentáveis, o aproveitamento desses subprodutos vai também na linha de economia circular: aproveitando a glicerina, a cadeia do valor do biodiesel é prolongada e ainda abre caminhos para novos combustíveis sem impactos climáticos.

Ministério da Saúde adquiriu mais de dois milhões de unidades de insulinas análogas de ação rápida

OMinistério da Saúde iniciou no dia 1º de setembro a distribuição da primeira remessa da insulina análoga de ação rápida com caneta reutilizável para todo o país. Nos próximos dias, serão distribuídos mais de 400 mil cartuchos do medicamento para atender à necessidade dos estados e do Distrito Federal (DF). O montante em distribuição faz parte de um total de mais de 1,3 milhão de unidades de insulina análoga de ação rápida adquiridas pela Pasta, por meio de compra emergencial internacional. A ação vai garantir o tratamento das pessoas que vivem com Diabetes Mellitus tipo 1 e retiram o medicamento pelo Sistema Único de Saúde (SUS) em todo o Brasil.

A importação excepcional foi autorizada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) no dia 05 de junho de 2023, por unanimidade, e seguiu normativa prevista na Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) nº 203/2017 da Anvisa, que dispõe sobre os critérios e procedimentos para importação, em caráter de excepcionalidade. 

Além disso, também foram adquiridas mais de um milhão de canetas descartáveis de insulina análoga de ação rápida para assegurar o abastecimento da Rede. Com as duas aquisições, mesmo em um cenário de escassez mundial, o Ministério da Saúde garante o abastecimento ao SUS e o atendimento de todas as pessoas insulinodependentes. 

As insulinas análogas de ação rápida (insulina asparte, lispro e glulisina) são insulinas semelhantes às insulinas humanas, disponibilizadas pelo Ministério da Saúde para o tratamento de pessoas com Diabetes Mellitus tipo 1. Elas são responsáveis por ajudar no controle do índice de glicose no sangue e, assim, garantir a qualidade de vida do paciente. 

As canetas para autoaplicação das insulinas são divididas em duas categorias: reutilizáveis (ou duráveis) e descartáveis (ou pré-preenchidas). É preciso ficar atento às orientações de uso! 

Caneta reutilizável

Pode ser usada inúmeras vezes, pois funciona com um cartucho (tubete) de insulina e pode ser reabastecido. É importante lembrar que é necessário armazenar a caneta reutilizável em temperatura ambiente, longe de umidade, poeira, temperaturas extremas e luz solar direta. 

Caneta descartável

Vem com um cartucho de insulina fixo, ou seja, a caneta já vem pré-preenchida. Quando a insulina acaba, a caneta deve ser devidamente descartada.

Para mais orientações sobre o uso das canetas de insulina, consulte as cartilhas abaixo: 

Cartilha de orientação às pessoas insulinodependentes.

Cartilha de orientação aos profissionais de saúde. 

Outras ações

Desde a incorporação da insulina análoga de ação rápida ao SUS, o Ministério da Saúde realiza sua aquisição de forma centralizada. No entanto, a Pasta enfrentou dificuldade na compra do medicamento, reflexo também da escassez mundial do produto. Dois pregões para compra do medicamento com registro no país – o primeiro realizado em agosto de 2022 e o segundo em janeiro de 2023 – não receberam propostas, restando fracassados. 

A partir do diálogo constante com as Secretarias Estaduais de Saúde e do DF e do monitoramento intenso dos estoques, o Ministério da Saúde, em parceria com o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), promoveu ações de remanejamento do medicamento entre os estados e o DF para manter o abastecimento na Rede Pública de Saúde. Os estados também foram autorizados a comprar diretamente o medicamento, com garantia de ressarcimento pelo governo federal. 

Diabetes

É uma doença causada pela produção insuficiente ou má absorção de insulina, hormônio que regula a glicose no sangue e garante energia para o organismo. O diabetes pode causar o aumento da glicemia, e as altas taxas podem levar a complicações no coração, nas artérias, nos olhos, nos rins e nos nervos. Em casos mais graves, o diabetes pode levar à morte. 

De acordo com a Sociedade Brasileira de Diabetes, existem atualmente no Brasil mais de 13 milhões de pessoas vivendo com a doença – o que representa 6,9% da população nacional. A melhor forma de prevenção é praticar atividades físicas regularmente, manter uma alimentação saudável e evitar o consumo de álcool, tabaco e outras drogas. 

Tratamento

O SUS oferece medicamentos de graça para tratar o diabetes no Brasil. As insulinas humanas NPH e regular, em frascos e tubetes, são distribuídas gratuitamente pelo Ministério da Saúde a toda Rede SUS do país. Além disso, tiras reagentes de glicemia e seringas também estão disponíveis nas Unidades Básicas de Saúde (UBS).

De forma complementar, as farmácias credenciadas ao Programa Farmácia Popular disponibilizam gratuitamente os seguintes medicamentos: insulina humana NPH e insulina humana regular, glibenclamida e metformina 500 mg e 850 mg.

No âmbito do Componente Especializado da Assistência Farmacêutica (Ceaf), está disponível a insulina análoga de ação rápida para o tratamento do Diabetes Mellitus tipo 1. Esta insulina está preconizada no Protocolo Clínico e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) de Diabetes Mellitus tipo 1, publicado pelo Ministério da Saúde. 

Ministério da Saúde

Expansão da atenção primária nas regiões Norte e Nordeste foi destaque em congresso

Aexpansão da atenção primária nas regiões Norte e Nordeste foi destaque no 9º Congresso Norte e Nordeste de Secretarias Municipais de Saúde. O evento foi realizado em Salvador (BA) entre os dias 4 e 6 de setembro, com mais de 4 mil participantes. O Ministério da Saúde participou de mesas e oficinas temáticas sobre vigilância em saúde, saúde digital e assistência farmacêutica no SUS.

Na região Norte do Brasil, neste ano, foram 7.063 equipes e serviços de APS credenciados. O credenciamento é o processo que o Ministério da Saúde realiza para o financiamento federal de equipes e serviços nos territórios, a fim de expandir e qualificar a APS. Desses credenciamentos, 3.846 foram de Agentes Comunitários de Saúde, 1.656 de equipes de Atenção Primária e 1.561 serviços e programas da APS.

No Nordeste do país, houve 18.913 credenciamentos de equipes e serviços neste ano. O estado da Bahia apresenta o maior número de equipes de Saúde da Família (eSF) credenciadas pelo Ministério da Saúde (1.116). O estado chegou ao total de 3.806, além de outros 2.125 serviços da Atenção Primária e mais 1.224 Agentes Comunitários de Saúde.

A Secretaria de Atenção Primária atuou no estande do Ministério da Saúde prestando assistência aos municípios. Representantes da secretaria participaram também de mesas temáticas sobre tecnologia, vacinação e financiamento da APS. O secretário Nésio Fernandes compôs a mesa do congresso que discutiu as estratégias desenvolvidas para superar os desafios na coordenação avançada do cuidado no SUS.

“Foi um evento grandioso, que demonstra de fato a capacidade de mobilização do SUS, dos seus gestores e trabalhadores. O ministério da saúde está retomando a ocupação desses espaços de modo qualificado, respeitoso, com proposições e com uma capacidade gigantesca para a construção de novos conceitos em torno de necessidades de atualização das políticas. Dentro do SUS, essas políticas só se materializam quando de fato envolvem o engajamento de todos os entes e que se legitima também na proteção por parte do controle social”, destacou Nésio.

Mais Médicos no Norte e Nordeste

O Ministério da Saúde está expandindo o atendimento da atenção primária nos estados do Norte e do Nordeste, por meio do Programa Mais Médicos. Com a retomada do programa, o primeiro edital deste ano (28º ciclo) abriu aproximadamente 2.890 vagas para o Nordeste e Norte, sendo, respectivamente 1.346 e 1.539 vagas.

Dos profissionais selecionados para as vagas, 1.134 já estão em atividade em municípios do Nordeste e 437 no Norte. Com esse reforço, mais de 5 milhões de brasileiros terão acesso ao atendimento médico na APS do SUS. Além disso, gestores de 2.684 municípios de todos os estados do Brasil manifestaram interesse em receber profissionais do Programa Mais Médicos na modalidade de coparticipação, conforme edital publicado em 19 de junho deste ano. Foram 10.340 vagas autorizadas para todo país.